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Como não tenho o dom de ler pensamentos, me preocupo somente em ser amigo e não saber quem é inimigo. Pois assim, consigo apertar a mão de quem me odeia e ajudar a quem não faria por mim o mesmo.
Quem não lê, não pensa, e quem não pensa será para sempre um servo.


quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

A Crise do Sistema Capitalista Norte Americano e suas conseqüências econômicas

A Crise do Sistema Capitalista Norte Americano e suas conseqüências econômicas*
Paulo Roberto Daltro de Carvalho**


Resumo
Quem tem acompanhado a nova manifestação da crise geral do capital em suas dimensões econômicas, sociais e políticas, tendo por epicentro basilar os EUA, voltou a conviver com o fantasma da crise iniciada em 1929: o crash financeiro, o suicídio, a depressão econômica, o desemprego, a fome, a corrupção, o fascismo e a guerra mundial. Diante deste fato, o problema que se impõe a todos que sofrem a opressão ou contestam o capitalismo é: o que fazer?


Palavras-chave: Economia Internacional; Política Internacional; Sistema Capitalista; Estados Unidos.


Introdução
As causas objetivas da crise vigente, intrínsecas ao próprio curso da acumulação do capital, têm suas particularidades na presente etapa. A aplicação das políticas neoliberais desatou um imenso volume inimaginável de capital fictício, que passou a atuar intensamente sobre a esfera da produção.
Em resumo, a realidade mundial é caracterizada, por um lado pela ofensiva imperialista e dominância neoliberal e, por outro, pela resistência crescente dos povos e nações em vários níveis e pelo surgimento entre os países em vias de desenvolvimento de pólos e blocos contra-hegemônicos, pela rápida ascensão econômica da China e pela recuperação da Rússia e de outros pólos dinâmicos na chamada periferia do Capitalismo. Também nessa situação global, se destacam importantes fracassos da ofensiva do imperialismo norte-americano nas suas guerras de ocupação e domínio. Essas tendências globais já vêm conformando um processo contraditório que indicam a existência de um mundo em transição, que expressa no conjunto um quadro mundial de declínio relativo da hegemonia unipolar dos EUA.

A Crise financeira e econômica do capitalismo
É natural que setores das oligarquias financeiras, por inércia ideológica e volume do seu capital, não admitam o desmoronamento, em tão pouco tempo, do mundo projetado: de ditadura do pensamento único neoliberal, de democracia política como valor universal e de unipolaridade mundial, sob a hegemonia dos EUA. Destes se podem esperar tão somente soluções de alto risco para toda a humanidade. Assim, cabe aos setores mais conscientes em todas as partes do mundo a habilidade necessária para conduzir este processo de transição da forma histórica da sociedade, em todos os seus aspectos fundamentais, capaz de superar esta pré-história no desenvolvimento humano. Mas exatamente neste momento de ruptura de paradigmas no sistema capitalista, a ausência de uma formação socioeconômica consolidada e de um movimento mundialmente organizado com visão estratégica para toda humanidade e força capaz de dissuadir ações da reação imperialista, se faz ressentir mais que em qualquer outro momento da história, projetando assim um novo período de grandes comoções políticas e sociais e o perigo de uma catástrofe mundial e humanitária.
Em uma matéria[1] publicada para promover seu novo livro acabado de publicar: “A Guerra dos Três Mil Milhões de Dólares”, os cientistas Stiglitz e Linda Bilmes da Universidade de Harvard, calculam que a guerra de Bush no Iraque custou só aos EUA, três trilhões de dólares. Neste estudo estão apenas incluídos os gastos bélicos diretos que se refletem no orçamento. Mas, para se chegar ao custo real, deve-se acrescer ainda os custos propriamente econômicos, que são calculados com base nos efeitos macroeconômicos e econômico-planetários da guerra, em pelo menos mais 3 trilhões de dólares. Segundo os dois cientistas, este montante total de 6 trilhões de dólares, que equivale aproximadamente ao valor de todas as reservas de ouro e divisas mundiais, é uma estimativa conservadora. Todos os meses os EUA precisam desembolsar mais de 16 bilhões de dólares em custos correntes para as guerras do Iraque e do Afeganistão, além dos 439 bilhões de dólares do orçamento de defesa. Com a privatização da guerra, 180.000 mercenários das empresas de segurança contratados para o Iraque pelo Pentágono custam, em média, dez vezes mais do que custa um G.I. regular (soldados de infantaria) – 400.000 dólares por ano, contra 40.000.
O aparato militar bélico e repressivo não impulsiona apenas a falência do império dos EUA, ele também explica a base fundamental e a essência da crise do capital que se tornou visível nas últimas 4 décadas (1973, 1980, 1989, 1998 e 2007) elevando-a da condição de crise do modo de produção social para uma crise ambiental que ameaça a vida no planeta. A crise energética, que se anunciou em 1973, não foi uma crise – como muitos pensavam – refletindo apenas as contradições sociais da política de monopólio dadas à nova composição da OPEP em função das transformações políticas no mundo árabe. Ela, sobretudo, enunciou as novas condições técnicas e de valor na composição orgânica do capital (a relação entre capital variável e capital constante - homem/máquina) que a guerra-fria (a corrida armamentista e aeroespacial) aportaria à economia mundial, dando lugar à revolução informacional, como expressão máxima do que se convencionou chamar revolução científico-técnica.
Em um outro ângulo podemos analisar a importância da estrutura militar na crise geral do sistema: como setor dinâmico de alto custo que, diante do fim da guerra-fria exige sua realização, revelando-se como crise de superprodução de equipamentos militares e de alta tecnologia. Neste contexto, os produtos tecnológicos do complexo industrial-militar se transplantam para toda a economia, com eles a revolução informacional, elevando a capacidade produtiva do sistema a uma escala planetária e, dialeticamente, às contradições que negam sua base material de existência social: o valor-trabalho e a contradição capital-trabalho; impulsionando o declínio da taxa de lucros, o crescimento da superpopulação relativa (exército industrial de reserva), logo a manifestação da Lei Geral da Acumulação Capitalista.


A situação econômica mundial e sua crise atual
A crise econômica mundial atual, iniciada pelo estouro da bolha imobiliária no setor de hipotecas subprime nos EUA – empréstimos de alto risco – em termos de economia nacional o estímulo ao crédito e ao consumo implica estímulo à produção. E quando este estímulo ou facilitação de crédito se volta prioritariamente para o setor imobiliário e da construção civil, isto indica que os demais setores da economia já haviam chegado ao limite. O desdobramento natural deste processo é, por um lado, o crescimento artificial do consumo e, conseqüentemente, da produção que nas condições atuais de globalização, vai sempre além dos limites absolutos de consumo da sociedade e formando bolhas financeiras e dos movimentos especulativos até explodi-las como ocorreu recentemente. Não necessitamos dizer que a especulação sobre os títulos de hipoteca, seja pelos bancos, seja pelos fundos de hedge, no mercado derivativo inflou os valores dos imóveis, logo a representação de valor dos mesmos nas bolsas. E também que o valor das ações das empresas do setor e relacionadas ao mesmo, igualmente sofreram esta deformação, reduziu o valor real de todas as empresas que detinham os títulos e, finalmente, que toda a economia americana sustentou o prolongamento do seu ciclo com base nesta espécie de bolha de todas as bolhas.
Quando passou-se a registrar o crescimento da inadimplência das pessoas físicas, durante o ano de 2007, resultando na perda de um milhão de moradias, a elevação da taxas de juros logo denunciou a crise. O freio no crédito com a alta dos juros, aprofundou a falência das pessoas físicas, logo refletindo a queda na demanda por imóveis e a queda no valor dos mesmos, desencadeando a falência das empresas mais comprometidas diretamente com o processo das hipotecas. Então os fundos de hedge descarregam sua posição em títulos imobiliários e a bolha estoura e com ela começam a estourar uma a uma as bolhas nos diversos setores.
O crash das bolsas em todo o mundo, segundo as notícias que oscilam todos os dias, já torram cerca de 50% da montanha de capital fictício em circulação atualmente. Este montante ultrapassa em mais de três vezes o valor do PIB mundial, ou seja, 167 trilhões de dólares; isto fora o mercado derivativo mundial, a praia dos hedges funds, estimado em um valor entre 9 a 10 vezes maior que o PIB mundial de 54,3 trilhões de dólares. Para os mais otimistas, com base nos pacotes baixados pelos governos dos EUA, França, Inglaterra, Alemanha, Japão, Espanha, Rússia, a soma pode chegar a 4,4 trilhões de dólares. Isto pode representar por um lado, a expansão da base monetária ainda maior em contradição à recessão mundial prevista por todos os países diante da retração dos investimentos produtivos, que segundo o relatório da ONU apresentado em maio de 2008. Neste ano o PIB será de apenas 1,8% e para 2009 em torno de 1,4%. Os Estados Unidos seu PIB cairá para -0,2% já em 2009 chegará no máximo a 0,2%. Da queda do consumo global, enfim, configurando-se o movimento de descenso do ciclo econômico mundial. Por outro lado, deveremos ter a futura guerra comercial e financeira entre os países mais desenvolvidos no capitalismo e destes com os países ditos “emergentes”, a deflação das moedas e dos preços das commodities, para através das importações manterem a atividade econômica, ao passo que os preços dos alimentos continuarão a sofrerá aumento. A OIT divulgou um relatório em que chama atenção para a taxa de desemprego que crescerá, estimando o total de perdas de postos de trabalho em 20 milhões e aumentando para cerca de 100 milhões o número dos que recebem até um dólar por dia; a FAO divulgou relatório chamando atenção para o crescimento da fome e pobreza mundiais. O recente relatório da OCDE já aponta que as desigualdades aumentaram de 7% a 8% em relação aos anos 1980, e a quantidade de pobres de 9,3% para 10,6% no conjunto da população, enfim, a crise social se ampliará e com ela as crises políticas em todos os países.
Entretanto, nada disso foi capaz de propiciar a estabilidade ao sistema ou impedir suas crises cíclicas, muito menos vencer as contradições basais do capital e as novas contradições que brotam neste momento histórico, cujas características principais Lênin em síntese definiu:

Se fosse necessário dar uma definição o mais breve possível do imperialismo, dever-se-ia dizer que o imperialismo é a fase monopolista do capitalismo. (...) Os monopólios, a oligarquia, a tendência para a dominação em vez da tendência para a liberdade, a exploração de um número cada vez maior de nações pequenas ou fracas por um punhado de nações riquíssimas ou muito fortes: tudo isto originou os traços distintivos do imperialismo, que obrigam a qualificá-lo de capitalismo parasitário, ou em estado de decomposição. Cada vez se manifesta com maior relevo (...) a formação de “Estados” rentiers, de Estados usurários, cuja burguesia vive cada vez mais à custa da exportação de capitais e do “corte de cupões”. Seria um erro pensar que esta tendência para a decomposição exclui o rápido crescimento do capitalismo. (LÊNIN, 1981. p. 664).

Marx ao explicar a crise do capital afirma: “A razão última de todas as crises reais é sempre a pobreza e a restrição ao consumo das massas em face do impulso da produção capitalista a desenvolver as forças produtivas como se apenas a capacidade absoluta de consumo da sociedade constituísse seu limite.” (MARX, 1988. p. 24). O Estado passa a intervir na economia – com relativa freqüência – nas transações privadas e coletivas, causando espécie à sociedade e ao empresariado brasileiro planejando-a e regulando-a através de políticas (tributária, fiscal, monetária e salarial) e de investimentos (na seguridade social e infra-estrutura), visando equilibrar os desníveis entre produção e consumo.


A Crise imperialista e suas guerras e luta de classes pelo mundo
O capitalismo vive um movimento contraditório: ele completa o seu domínio mundial sobre povos, nações, espaços, modos de produção e atividades num processo não de boom sistemático, mas de crise e contração recorrentes. A verticalização toma o lugar da horizontalização, que encolhe a produção efetiva e o mercado e a exclusão substitui a inclusão, tudo isso na forma de organizar o trabalho e a produção no interior da relação trabalho-capital no seu estágio atual, após a crise do fordismo e da social-democracia e a emergência da reestruturação produtiva e seu corolário político, o neoliberalismo. Por isso, trata-se de uma crise só, ao longo da qual existem momentos para cima e para baixo, mas sempre em torno de uma linha média de crise e de contração de longo prazo — uma crise diferente das anteriores, fruto de um estágio de saturação objetiva dos pressupostos da produção e do mercado. A ativação da acumulação pela via fictícia, o inusitado desemprego mundial que faz o consumo retrair-se ao extremo, bem como a recorrência aos incentivos políticos à produção são, apenas, algumas, entre muitas outras provas, de que esses pressupostos estão a sofrer um processo de exaustão.
Esta crise, com as características de um sistema financeiro globalizado, gigantesco, desregulado e indomável, reduzindo a demanda social solvente, como acaba de acontecer nos EUA, e reforça os graves problemas sociais em todo o mundo. Com isso, se encontram a crise de superprodução e a crise financeira, formando uma só crise universal.
Trata-se de uma crise de superprodução generalizada clássica, mas é mais do que isto: é uma crise diferente de todas as crises antecedentes, pois se trata de um estágio em que o capitalismo devasta, sem cessar, suas próprias bases de existência e acumulação ampliada, tudo isso em escala mundial crescente; uma crise de início e aceleração do esgotamento da própria ordem do capital, do modo de produção capitalista, que teve de cumprir a mais plena evolução e mundialização imperialista para finalmente produzir suas próprias barreiras, além das quais só pode contrair-se.
A prolongada crise atual, conjugada com o acirramento das contradições e da rapina postas em ação pelos principais países e grupos de capitais imperialistas, agravada pela destacada arrogância dos capitais e do Estado dos EUA em manter-se à testa de todo o sistema capitalista mundial, tem arrastado o globo terrestre para sombrias perspectivas. O que aconteceu a 11 de setembro em New York também é resultado — e não causa — de tudo isso. Por outro lado, a devastação, por um bombardeio sistemático, que os EUA e nações aliadas praticaram no Afeganistão, sob a farsa de que se trata de uma cruzada das forças “do bem” contra as do “mal” (Bin Laden e Cia.), não passa de uma farsa a esconder toda uma estratégia de ocupação e dominação cabal do imperialismo sobre todas as regiões do globo como o próprio Afeganistão, país que se situa no centro das maiores reservas de petróleo do mundo.


Conclusões
A crise política ameaça jogar por terra a hegemonia mundial dos EUA e seu sistema imperial. Ninguém se iluda quanto ao caráter desta crise, ela é uma crise geral do modo de produção capitalista, que retoma o processo de transição histórico da sociedade para um novo modo de produção, ainda não delineado em todos seus contornos, exigindo a intervenção dos sujeitos históricos, como classes sociais cônscias, para além da tragédia humana – guerras, caos econômico e social, catástrofes geológicas e climáticas que acompanham o processo. Faz-se necessário o trabalho e o esforço incansável na edificação de um modo de produção e vida mais elevado, justo e solidário para todos.
Os papéis nos Estados Unidos e na Europa caíram em média mais de 25%. A desvalorização mensal acumulada em outubro na maioria dos principais mercados do mundo será uma das maiores já testemunhadas por qualquer pessoa ainda viva. Até agora a crise fez a bolsa de valores de São Paulo cair em cerca de 54%, várias empresas perderam em torno de US$40 bilhões aplicados em títulos de hipotecas nos EUA e tantas empresas e bancos afundaram. A moeda brasileira se desvalorizou cerca de 40% frente ao dólar, elevando a dívida indexada na moeda americana e comprometendo a capacidade de pagamento do país, aumentando o índice do risco-país que acarretará na queda dos investimentos externos, afetando a agricultura, a construção civil e a indústria automotiva, elevando o desemprego, a inflação e a carestia.
O Brasil necessita urgentemente de um caminho alternativo, uma integração que tenha como objetivo trocas iguais de mercadorias. Para tudo isto é necessário pensar geopoliticamente o país em termos da articulação de um sistema de defesa continental contra o imperialismo.
A crise é mundial, estrutural e não é um parênteses que será fechado em breve. Não podemos, após esta crise, continuar a governar o mundo com os mesmos instrumentos, instituições e idéias do passado.



Referências Bibliográficas
ABREU, H.B. As novas configurações do Estado e da Sociedade Civil. Capacitação em Serviço Social e Política Social. Brasília: CFESS/ABEPSS/CEAD/UNB, 2000.

BEINSTEIN, J. - Capitalismo Senil - A Crise da Economia Global. São Paulo: Editora Record, 2001.

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. São Paulo: Nova Cultural, 1988.

LÊNIN, V.I. Imperialismo fase superior do capitalismo. São Paulo: Global Editora, sexta edição, 1991.

LUXEMBURGO, Rosa. A Acumulação do Capital: contribuição ao estudo econômico do
Imperialismo. São Paulo: Nova Cultural, 1985.

SCHINCARIOL, Vitor Eduardo. Endividamento externo da economia dos Estados Unidos (1980-2004): uma interpretação kaleckiana. São Paulo: Simpósio de Pós-Graduação em História Econômica na USP, 2008.

[1] http://drauziomilagres.blogspot.com/2008/02/custo-da-guerra-de-bush-us-3-trilhes.html


*Tema Final proposto para a disciplina de “Economia e Política Internacional” do curso de RI.
**Aluno do Curso de RI do PT. Gestor de TI. Membro da Executiva Municipal do PT de Simão Dias/Sergipe

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