Quem eu sou?

Como não tenho o dom de ler pensamentos, me preocupo somente em ser amigo e não saber quem é inimigo. Pois assim, consigo apertar a mão de quem me odeia e ajudar a quem não faria por mim o mesmo.
Quem não lê, não pensa, e quem não pensa será para sempre um servo.


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quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

O papel do cristão nas eleições



Esta questão reflete muito mais nossas contínuas decepções com os políticos do que a nossa dúvida diante da múltipla possibilidade de escolha entre bons candidatos.
Em quem votar? Se dissermos "Em ninguém" ou "em branco", não estaremos respondendo com seriedade ao nosso compromisso cristão, pois acabaríamos favorecendo, com nossa omissão, algum partido ou candidato sem compromisso.
 O vocábulo política vem do grego, polis, ‘cidade’. A política, pois, procura determinar a conduta ideal do Estado, pelo que seria uma ética social. Política significa simplesmente a arte de governar. Para muitos evangélicos, entretanto, essa palavra não soa bem porque ela carrega um estigma ruim, dado o comportamento de alguns políticos, especialmente quando se desviam do objetivo devido e vão após os prazeres corruptos que desmoralizam a vida cristã.
Diz a nossa Constituição que “todo poder emana do povo e que em seu nome é exercido”. Portanto, como dizem os sociólogos, “todo povo tem o governo que merece”. O governante sai do meio do povo e é escolhido pelo povo. Porque uma vez escolhido os governantes de modo errado, só resta democraticamente suportá-los, até nova oportunidade de mudá-los. Enquanto o povo não souber escolher bem seus representantes não terão dias melhores.
A principal arma dos cristãos no regime democrático é o voto. É através dele que o cristão pode fazer valer a sua vontade e o seu legítimo poder. É pelo voto que cada cristão participa dos destinos de sua nação. É pelo voto que ajuda a nação a mudar de rumo, que elimina os maus governantes, etc.
Para que o cristão tenha uma participação ativa na política é necessário incentivar o levantamento e o debate dos problemas sociais em cada município, os problemas do estado e do país. É importante participar de debates, diálogos entre amigos e familiares no sentido de instruir os que não têm informações corretas para que não sejam manipulados pelas propostas eleitoreiras.
O cristão deve votar com a consciência, escolhendo entre todos os candidatos o melhor, independente de interesses, sentimentalismos, grau de parentesco ou amizade. Também disso vamos prestar contas à Deus um dia. O eleitor cristão precisa ter em mente que quando ele vota está exercendo certo poder, e Jesus disse que todo poder vem do alto e é dado por Deus.
Vamos votar de maneira consciente, sem aceitar manipulações. Nossa confiança não é posta em homens, mas em Deus que nos governará através deles. Em qualquer situação os governos humanos serão apenas um paliativo para o problema do homem. Somente Deus através de Jesus tem a solução definitiva para o problema homem.

 Oração

"Orienta-nos, Senhor, para escolhermos com sabedoria os governantes do nosso país e do nosso estado. Detém a corrupção, a ganância e as injustiças. Que o Senhor nos abençoe, para o bem do Brasil, do nosso estado, da nossa cidade e para Sua glória. Em nome de Jesus, Amém."

Paulo Daltro é evangélico, membro da Igreja Presbiteriana em Simão Dias. Graduado em Tecnologia da Informação, Pós-Graduando em Gestão de Pessoas. É dirigente político e Analista em Relações Internacionais.

O MUNDO É DOS ESPERTOS



“O mundo é dos espertos”, alguém já dizia. O problema é quando “o outro” é mais esperto – cá para a gente. Hobbes definia a natureza humana como uma arma em franca hostilidade que, caso não abrandada por um onipotente poder, traria a guerra de todos contra todos. A sociedade humana então seria impossível em termos de civilização sem um poder cuja natureza poderia variar entre o poder sobrenatural, o carismático e o racionalmente eleito.

Hoje, e como sempre, assistiremos a uma briga na sucessão municipal, cuja natureza está diretamente ligada a essa natureza egoísta e golpista do ser-humano. A nossa Constituição, vale lembrar, deu autonomia ao povo organizado partidariamente, artigo 17, 1º, da Constituição que resguarda a ”adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações”. Assim, impassíveis, assistimos os casos de flagrantes desrespeitos aos cidadãos sob sua ótica de “autonomia partidária” – politiqueira eleitoreira para ser mais claro.

Na política, apesar dos “regulamentos” preverem só um eleito (majoritário), proclamam-se vários campeões de “votos”, dirigentes aproveitam-se dos apelos do povo para proclamarem um “vale tudo” fazendo da política uma grande vitrine de como não se deve gerir um “mandato”, como também fazem da política algo acima da lei. Vejam o casuísmo do pós-eleição ao proclamar os derrotados “campeões de votos” e os mais votados em acordos políticos de barganha de cargos.

A graça do acordo político é obra digna de um aristocrata do século 18 que concedia honras aos seus fiéis apadrinhados. E não é por causa do sorriso do prefeito, governador ou presidente não, é dinheiro mesmo. Os correligionários se aproximando da eleição, negociam seus “votos garantidos” em detrimento dos pobres pequenos partidos que possuem um poder de barganha menor.

A união de vários partidos sem expressão, conhecido como “pequenos”, no uso de suas “forças” reorganizadas, - igual a um time de futebol, onde contratam alguns nomes conhecidos - agora, agindo de acordo com a regulamentação do Código Eleitoral, tentam quebrar o monopólio dos “predadores e perpétuos” do poder. Eles, que tem a “máquina” como grande amiga, que por sua vez tentam se manter com seu “aliado” de maior confiança e que poderá influenciá-lo sempre que achar conveniente. Já os “pequenos” partidos, como perderam a disputa, tentam agora através de um “golpe” sórdido atrapalhar o que seria um dos melhores negócios para os “grandes” continuarem no poder, até mesmo para seus correligionários derrotados nas proporcionais passada.

Por que então estes cidadãos ocasionalmente representantes dos partidos ditos repetitivamente “pequenos” querem melar a “licitação” promovida pelos grandes? Isso nem Freud Explica.

É tempo de mudanças e no plural


Ainda que bastante atarefado, decidi, após assistir durante um ano a atual gestão municipal, escrever este pequeno artigo sobre o tempo em que nos encontramos.

Minha motivação
“Somente na medida em que nos fizermos íntimos de nossos problemas, sobretudo de suas causas e de seus efeitos, nem sempre iguais aos de outros espaços e de outros tempos, ao contrário, quase sempre diferentes, poderemos apresentar soluções para eles” (Paulo Freire). 

Pensando alto
Esta história de que o gestor está do lado do povo merece uma análise mais criteriosa após toda a "poeira baixar". Penso que ele terá que se empenhar um pouco mais para confirmar o discurso. O fato é que ele deve estar entre a cruz e a espada, pois se ficar com o povo, compra briga com os "capa-bodes", se ficar do lado da monarquia, o prejuízo pode ser muito grande. 2010 já chegou! Viva o ano novo! Viva! Viva! É ano de eleições. Eita ano bom!

Mais Feliz!
Essa palavra parece fazer mágica na hora de dirigir palavras ao povo. O povo se sente importante quando o homem fala que é pra todos nós. Nestas horas é bom até falar mal de outras cidades menos felizes para tentar diminuir a gravidade de uns problemas bem próprios daqui. O senhor do poder recebe umas aulas e uns treinamentos a respeito do que o povo gostaria de ouvir mesmo nunca a coisa se tornando realidade.
O mundo e a vida são mais complexos que a certeza do gestor e seus técnicos, economistas, políticos que odeiam o debate e vivem distanciados da realidade. Para eles administrar se resume a reservas estratégicas, estatísticas, juros e finanças controladas, obedientes ao Estado. Eles representam de fato “o Estado contra o povo!”
Agem como que destituídos de consciência. A consciência sobre os atos que gera as ações obrigatórias de interesse primordial para o bem comum. A estrutura do poder ignora realidades complexas e diversas. Ignora a consciência que move os homens para as obrigações de proteção da família e do território onde retira o seu sustento.

O outro lado da moeda
O povo também tem a sua culpa, porque a união é tão grande para o futebol e carnaval, então quando somos lesados todos os dias pelos supostos governantes, ninguém faz nada, só sabem pedir a Deus. Como diz o ditado: “O povo tem quem merece no poder”.

Ao homem da caneta
“Abre a boca a favor do mudo, pelo direito de todos os que se acham desamparados. Abre a boca, julga retamente e faze justiça aos pobres e aos necessitados.” (Provérbios 31.8-9).

Pra refletir
A gente, que paga impostos para alimentar essas estruturas de poder, espera a recompensa em dias melhores, em (...)Dias Mais Feliz. Tem consciência da vida ameaçada. A maioria tem uma crença e agradece a Deus, da maneira como o concebe, encontrando o conforto espiritual necessário para manter a esperança de cada dia.

Peço a Deus por minha gente, pois os dias são maus e os trabalhadores, poucos.
Ah! Esqueci! O Estado é laico! Desculpa pelas palavras bíblicas.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Realismo mágico na política externa

O Globo
Realismo mágico na política externa
Rubens Barbosa
A distância entre a retórica e a realidade nas declarações públicas sobre qualquer assunto de altos funcionários do atual governo é conhecida. No tocante à política externa, em especial, esse descompasso está adquirindo características preocupantes, pois a ele se soma uma superestimação de nossa capacidade e de nossos recursos na implementação do que o presidente Lula denominou de "política da generosidade" para com nossos vizinhos do subcontinente. "O Brasil tem que assumir definitivamente a responsabilidade pela integração da América do Sul. Não há concessões excessivas quando as diferenças de dimensão são tão extraordinárias e quando nossos interesses as exigem para a construção na América do Sul de um bloco que nos fortaleça a todos", reza a doutrina oficial. O mais novo desdobramento da política externa em relação à região foi a sugestão de que "o Brasil deveria promover um Plano Marshall sul-americano para superar a devastação diária causada pelo subdesenvolvimento", no dizer de um dos proponentes da idéia. Essa eventual iniciativa brasileira, segundo se anuncia, deveria imaginar um programa mais amplo, mais enérgico, mais generoso e mais ágil dos países mais ricos da região em favor daqueles mais pobres, a exemplo do Plano Marshall. Em termos de política externa, estamos entrando na fase do realismo mágico. Resta saber quem, na categoria dos mais ricos da região, se disporia a levar adiante a idéia junto com o Brasil. Argentina e Venezuela seriam os candidatos naturais. Parece mais realista, contudo, nas circunstâncias difíceis que enfrentam internamente, incluí-los hoje entre os que devem de demandar recursos para suas respectivas reconstruções econômicas.... O Brasil já comprometeu centenas de milhões de dólares dos cofres públicos com apoio financeiro aos países da região (perdão de dívidas do Paraguai e da Bolívia), aumento da contribuição do Brasil à Corporación Andina de Fomento e a majoritária contribuição financeira do Brasil no Focem. Agora, anunciam-se uma hidrelétrica binacional com a Bolívia (não bastam os problemas com o Paraguai em Itaipu) e a cessão, sem pagamento, de energia à Argentina e ao Uruguai (em troca de energia futura), como novos exemplos de generosidade. Seria legítimo esperar que resultados concretos dessa política generosa tenham alguma contrapartida que possa ser contabilizada positivamente na defesa de nosso interesse nacional. Seria constrangedor, porém, elaborar aqui uma lista das contrapartidas que o Brasil recebeu. Basta lembrar a última delas. A Argentina manifestou-se contrária à posição do Brasil/Mercosul nas negociações multilaterais de comércio da Rodada Doha, peça fundamental da estratégia de negociação comercial externa do atual governo. Não está em questão o real e justificado interesse do Brasil em ter vizinhos com uma economia estável e em desenvolvimento. A liderança para um plano Marshall na região, contudo, é uma proposição totalmente diferente. Como atribuir prioridade a tal iniciativa quando se sabe que algumas regiões de nosso país, em especial o Nordeste e o Norte, são mais pobres do que a maioria de nossos vizinhos? Como concentrar esforços e grandes recursos financeiros para generosamente ajudar nossos hermanos, quando os verdadeiros necessitados são nossos irmãos? Não podemos ignorar que o Brasil, nos últimos dez ou quinze anos, com a estabilidade da economia, e impulsionado pelo crescimento da economia mundial e do comércio exterior, vem se projetando de forma crescente no exterior. Pela internacionalização das muitas empresas brasileiras e por estar no centro das discussões de alguns temas que interessam a todos os países, em especial os desenvolvidos, como a questão energética (etanol e petróleo), de meio ambiente (mudança de clima) e alimentos (escassez de alguns produtos e alta cotação das commodities), a situação externa, nos seus fundamentos, modificou-se para o Brasil. Para nós, o Mercosul se tornou pequeno. A médio prazo, se continuarmos nesse caminho, também a América do Sul ficará pequena para o Brasil. Urge que o governo e as empresas brasileiras pensem globalmente. Nossos interesses imediatos estão no entorno geográfico, mas não devemos perder de vista as oportunidades que estão se abrindo e se abrirão nos próximos anos para o setor privado brasileiro em regiões onde se localizam os maiores e mais dinâmicos países do mundo. RUBENS BARBOSA é presidente do Conselho de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Uma previsão marxista...

Uma previsão marxista...
“A produção capitalista acarreta, com a inexorabilidade de uma lei da natureza, a sua própria negação.”
Karl Marx, O Capital.
Marx não foi apenas um cientista social, ou um filósofo, como muitos pretendem, ou ainda um economista, como ele próprio pretendia. Ele foi também um profeta. Todos os profetas traduzem algum sentimento de insegurança que perpassa a sociedade de seu tempo; eles sempre atuam sobre os medos e as incertezas que todos ostentam quanto ao futuro – por definição, sempre desconhecido – e ousam antecipar caminhos de ruptura, antevendo, ou até prevendo, catástrofes, ou prometendo a redenção das sociedades nas quais vivem. Eles estão geralmente errados, aliás totalmente equivocados, na maior parte das vezes, o que não os impede de adquirirem fama – eventualmente fortuna, também – e de posarem de agentes da mudança, ainda que de maneira involuntária (muitas vezes de forma irresponsável, ao não anteciparem o grau de sofrimento humano e as perdas sociais trazidas pelas grandes soluções de “ruptura”, por eles propostas).
Marx foi um desses “catastrofistas” do primeiro capitalismo, escrevendo sobre os horrores da Inglaterra vitoriana e antecipando um futuro de abundância e de bem-estar por meio do estabelecimento de um sistema que seria capaz de superar as deficiências visíveis do capitalismo do seu tempo: as longas horas de trabalho, a super-exploração do trabalho de mulheres e crianças, as condições insalubres de produção – sem falar das condições de habitação e alimentação, mas disso, pelo menos, os capitalistas não podem ser considerados responsáveis – a concentração de riquezas e de poder nas mãos de uns poucos. Marx profetizou que esse sistema alternativo, chamado de socialismo, liquidaria, simplesmente, com a “exploração do homem pelo homem”, sem explicar, porém, como seria possível organizar a produção de bens – ele preferia não falar de mercadorias para o novo modo de produção, pois acreditava, equivocadamente, que a sociedade socialista poderia prescindir de mercados – em bases igualitárias e sem qualquer linha de comando, posto que isto sempre implica uma certa desorganização do processo social de produção.
Marx foi, também, um dos maiores profetas dos tempos presentes. Ele previu, por exemplo, a globalização capitalista. Acertou totalmente. Apenas não podia antecipar que o sistema sonhado e acalentado por ele, o socialismo estatal, iria atrasar e atrapalhar a globalização capitalista em pelo menos três quartos de século. Esse foi, paradoxalmente, o papel histórico do socialismo soviético, que, junto com os fascismos dos anos 1930 e as diversas formas de coletivismo econômico do século XX, atrasou a globalização capitalista em mais ou menos 70 anos. Os discípulos modernos de Marx, inconseqüentes quanto ao sentido profundamente globalizador da sua mensagem – ela está no Manifesto do Partido Comunista, de 1848 – continuam tentando atrapalhar o itinerário avassalador da globalização capitalista, o que só pode delongar, na visão marxista, o advento tão esperado da sociedade socialista. Sim, claro: a mensagem marxista sobre a necessidade da globalização do capital é a de que, com ela, estaria sendo acelerado o processo histórico que traria, inelutavelmente, a implantação do socialismo.
Marx foi um messiânico, um milenarista, um salvacionista, um profeta do fim dos tempos, inteiramente em linha com a tese sobre o fim da história de seu mentor e mestre repudiado: Friedrich Hegel. Ainda que os antiglobalizadores atuais – que são todos um pouco de esquerda, como convém – protestem contra a proposta de Francis Fukuyama, ela é inteiramente consistente com a escatalogia marxista, que previa o fim da história a partir do advento do socialismo. Falo em “proposta” porque os críticos mais ferozes de Fukuyama provavelmente nunca leram o seu ensaio e provavelmente nem se deram conta de que o título traz um ponto de interrogação, confirmando que o autor pretendia debater uma tese, não antecipar um resultado. Ele sequer chegou a prever (inclusive por que seria anacrônico naquele momento) o fim da União Soviética enquanto Estado centralizado e passavelmente autoritário, tendo se contentado em propor, ou até antecipar – como pequeno profeta que foi –, que a derrocada dos regimes economicamente centralizados e politicamente autoritários inaugurava uma nova era na qual escolhas fundamentais iriam girar em torno do modelo das democracias de mercado. Ele foi um “jovem hegeliano”, como Marx.
Marx foi excessivamente pessimista quanto ao capitalismo realmente existente em seu tempo e excessivamente otimista quanto ao socialismo do futuro, que ele bosquejou, simplesmente, em duas ou três pinceladas redutoras, do tipo “de cada um segundo as suas capacidades, a cada um segundo as suas necessidades” (isso não quer dizer nada, não é mesmo?). Fukuyama, por sua vez, foi excessivamente otimista quanto às possibilidades de uma economia puramente de mercado e quanto a um regime político democrático-liberal, desconsiderando, talvez, todos os elementos de autoritarismo embutidos em sistemas econômicos travados pelo baixo crescimento, por imensas desigualdades sociais e por iniqüidades educacionais que mantêm a maior parte das pessoas na ignorância política e na incultura econômica. Uma pequena revisão das ditaduras ainda sobreviventes neste século confirma esta constatação, a exceção – sempre existem exceções – sendo a China, com sua excepcional taxa de crescimento econômico e sua ditadura exemplar.
Marx não se contentou em prever o fim do capitalismo; ele pretendeu fundar uma nova era, ou, pelo menos, um novo “modo de produção”, cuja inelutabilidade decorreria logicamente das contradições do capital, numa síntese dialética que constituiria o seu próprio “fim da história” hegeliano. Sua frase, colocada em destaque na abertura deste pequeno ensaio – “A produção capitalista acarreta, com a inexorabilidade de uma lei da natureza, a sua própria negação” –, oferece menos o ponto de partida de uma digressão filosófica sobre o modo de produção capitalista do que a conclusão finalística para uma tese que já estava provada de antemão: para Marx, o capitalismo iria necessariamente desaparecer – com a abolição de sua forma historicamente específica de realização, a extração de mais valia – para dar lugar a um modo superior de organização social da produção, no qual aquelas contradições já não estariam presentes.
Marx deixou inconcluso o “manual de instruções” sobre como deveria (ou como poderia) ser construído o sistema que funcionaria, segundo seus promotores, sem qualquer extração de mais valia, isto é, sem a exploração do homem pelo homem. Os economistas da era soviética bem que tentaram estabelecer as bases de uma “economia política marxista” que fizesse a “desconstrução conceitual” da “economia política burguesa” e operasse a economia do socialismo real sobre novas bases, mas não se tem notícia de que a natureza da “exploração” tenha sido radicalmente alterada. Ao que se sabe, o esforço não foi muito bem sucedido, pois que, do contrário, se isso tivesse ocorrido, o “novo” sistema econômico socialista ainda estaria disputando, nos super-mercados da história, as preferências dos consumidores potenciais (sem ter sido reduzido, como atualmente, a dois obscuros redutos nas antípodas do hemisfério norte).
Marx não foi feliz, portanto, em seu legado, uma vez que o objeto central de sua análise, o modo de produção capitalista, resistiu ao seu profetizado “fim da história”, insistindo teimosamente em viver e conseguindo, inclusive, enterrar o modo de produção alternativo que lhe deveria suceder. A bem da verdade, não foi tanto o capitalismo que enterrou o socialismo – para empregar a expressão utilizada por Krushev em 1960 –, mas o próprio socialismo que demonstrou, de maneira totalmente autônoma, ser inviável enquanto organização alternativa da produção de mercadorias. Isto se deve a que Marx – e, de forma ainda mais acentuada, Lênin e seus seguidores – desprezou completamente a ação dos mercados, que ele julgava caóticos e necessariamente propensos a crises de super-produção (com o desperdício conseqüente de meios de produção e das próprias mercadorias produzidas).
Marx e seus sucessores foram infelizes na sua grandiosa empreitada regeneradora da sociedade. A razão é muito simples: eles tentaram contrariar uma das leis econômicas mais simples que se possa conceber em toda a história da humanidade, a lei da oferta e da procura, colocando em seu lugar o planejamento centralizado. Mais grave ainda, eles ignoraram completamente um instrumento fundamental – não da sociedade capitalista, mas simplesmente de qualquer atividade econômica – e necessário à formação de preços: o cálculo econômico, que é um sinalizador indispensável à escassez relativa de fatores e insumos de produção, substituindo-o pela atribuição administrativa, e arbitrária, de um “valor” de troca. Não contentes, eles pretenderam recusar a retribuição de acordo com o mérito – ou seja, pela quantidade de trabalho embutido numa dada atividade produtiva –, colocando em seu lugar a referida “lei de Gotha” sobre as capacidades e as necessidades. Surpreende que “intelectuais” do século XXI retomem ingenuamente essa fórmula vazia (posto que tautológica), uma vez que essa “lei” não resolve rigorosamente nada do lado da produção, contentando-se em “organizar” generosamente a redistribuição.
Marx ainda tem muitos seguidores hoje em dia, não exatamente nas faculdades de economia – onde devem ser raríssimos aqueles que ainda pretendem extrair algum sinal de inteligibilidade de um livro gótico como O Capital –, mas mais precisamente nas ditas humanidades, onde é maior o número de professores e alunos completamente afastados dos circuitos normais da produção capitalista e que podem, talvez, se conceder o ócio (remunerado?) de pontificar sobre a “dominação do capital” e a “hegemonia burguesa” sem que alguém lhes venha cobrar um mínimo de coerência ou algum comprometimento com a realidade. Não sei o que pensaria Marx, se vivo fosse, de seus atuais seguidores. Ele provavelmente balançaria a cabeça e diria: “mas eles não entenderam nada...”
Marx, presumivelmente, não estaria marchando contra a globalização capitalista ou contra os capitalistas de Davos e de Wall Street: ele estaria pedindo mais globalização e mais dominação do capital, no pressuposto de que isso faria avançar a humanidade para patamares mais elevados de modernização, constituindo novos exércitos industriais, os futuros “coveiros” do capitalismo. Ele certamente não estaria se alinhando com os antiglobalizadores de Paris, de Porto Alegre ou de Caracas, pois acharia suas “teses” – se é que elas existem, pois ainda não se viu quais poderiam se abrigar sob esse conceito – muito confusas e impregnadas de proudhonismo romântico: ele tenderia a considerar esse ajuntamento heteróclito de jovens idealistas e de velhos esquerdistas reciclados um bando de anarquistas incuráveis, de bakuninistas irrecuperáveis, aos quais faltam organização e princípios claros para se oferecerem como a vanguarda da classe do futuro.
Marx, provavelmente, viajaria regularmente a Davos (a convite, com tudo pago), para dialogar (unilateralmente, claro) com os capitalistas globalizados da atualidade, que já não usam mais aquelas cartolas rombudas do seu tempo, mas que continuam a fumar charutos e a contar dinheiro (agora bem mais virtual). Não é certo que ele recorresse a alguma versão modificada do “esqueçam o que eu escrevi”, mas existem indícios de que ele estaria colaborando regularmente com o Financial Times e com a The Economist – que já existia na sua época –, defendendo a globalização capitalista dos ataques mais irracionais dos bakuninistas enraivecidos e dos proudhonianos confusos que tentam convencer os cidadãos de boa vontade de que “um outro mundo é possível”.
Marx nem precisaria escrever qualquer panfleto vitriólico sobre a “miséria da antiglobalização”. Ele simplesmente pediria aos antiglobalizadores que, em lugar de slogans pouco esclarecedores, eles fizessem o que ele já tinha feito, em seu tempo: sentar os traseiros em alguma cadeira de biblioteca e produzir, com base em relatórios sobre o funcionamento do modo de produção capitalista e suas realizações efetivas, a “economia política” desse “outro mundo possível” que eles tanto pregam. Quaisquer alternativas, finalmente, têm de ser apresentadas, no mínimo, com as “instruções de uso”. Marx poderia hipoteticamente dizer que, sem que se consiga vislumbrar um mínimo de consistência nas “idéias” exibidas pelos antiglobalizadores, fica muito difícil entender quais seriam, exatamente, as críticas que eles pretendem fazer ao atual ciclo do modo capitalista de produção, que aparentemente ainda está em sua juventude.
Marx, num ponto, poderia parafrasear, um século e meio depois, sua afirmação em epígrafe: “A globalização capitalista acarreta, com a inexorabilidade de uma lei da natureza, a sua própria negação”. Os antiglobalizadores estão aí, para provar o acertado desta tese. Mas, como ele mesmo afirmou, na abertura do seu Dezoito Brumário: a história se repete, a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa. Aparentemente, o circo da antiglobalização está se repetindo como uma comédia de equívocos, já que não consta que, dos seus encontros ruidosos e perfeitamente globalizados, alguma proposta coerente e factível, para superar o atual ciclo da globalização capitalista, esteja sendo forjada pelos arautos do movimento alternativo.
Marx disse uma vez que, do seu ponto de vista, ele não se considerava marxista. Caso pudesse retornar ao nosso convívio, ele talvez ele pudesse acrescentar que já não se “fazem” mais marxistas como antigamente...

Mercosul: Integração Regional e Globalização

Mercosul: Integração Regional e Globalização
Fernando Augusto Albuquerque Mourão
Professor Titular da USP
Prefácio
O livro que ora apresento se impõe por si. Faz parte de um processo de reflexão do qual já resultaram vários estudos sobre a União Européia, o Mercosul e as relações entre as duas instituições, organizados e concebidos pelo Professor Paulo Borba Casella.
O tema da integração regional e da globalização, visto de uma ótica sistêmica, lembra-nos os dizeres que aparecem nas tabuletas que chamam a atenção em áreas em obras: homens trabalhando. Estamos diante de um processo que vem acontecendo, como no caso da Europa, há mais de quatro décadas: da fase de uma Europa econômica à de uma Europa política, testemunharam-se necessidades e óbices de uma engenharia que se apelidou de Europa de geometria variável, Europa a duas velocidades, Europa a la carte. A Europa a duas velocidades refletiu o ritmo dos processos integrativos, aceitando, contudo, o primado de que os objetivos da UE deviam ser respeitados mutuamente; a Europa a la carte permitia aos Estados optar ou não pela adesão às disposições comunitárias; na perspectiva da Europa de geometria variável, nem todos os Estados participaram das mesmas ações. Num arranjo possível dos subsistemas internacionais, enfatizou-se ora o fator econômico-financeiro, ora o fator estratégico; às vezes o fator político, outras vezes o social e o cultural. Hoje, a Europa dos Cidadãos — regida pelo princípio estruturador da economia do livre-comércio, da política democrática, de aspectos sociais solidários — é o resultado de uma vontade política gradual, da qual resultaram o Tratado da CECA (1951), o Tratado de Roma (1957), o Ato Único (1987). Tudo isso deu lugar ao Mercado Único (1993) e avançou para a União Econômica e Monetária e para a União Política, os Acordos de Maastrich (1991), o Tratado de Maastrich (1992, nascendo a União Européia em 1º/1/93) e, numa clara linha de revisão constante dos atos, o Tratado de Amsterdã (1997), tido como uma primeira revisão do Tratado de Maastrich, a par de uma ação criativa do Tribunal de Justiça, que, paulatinamente, foi criando uma jurisprudência comunitária que consagrou inter alia a aplicabilidade direta das disposições do Direito Comunitário, vencendo as resistências nacionais dos países-membros.
Já se estava sentindo a falta de uma reflexão em torno das relações entre a globalização e a regionalização, quer no sentido da operacionalização, quer no sentido da ordenação na perspectiva de uma caminhada de mudanças, mutações para alguns, com vistas não ao homem ideal, mas à cidadania do possível. No mundo flutuante no qual nos inserimos, é bom não perder de vista, entre os fatores estruturantes da globalização e de regionalização, os objetivos de uma cidadania do possível, o que certamente teria levado Paulo Borba Casella a introduzir o capítulo Da Constituição dirigente, ao direito comunitário dirigente, do mestre coimbrão José Joaquim Gomes Canotilho, pondo-se em evidência a captação dos fatores reais e os encaminhamentos de ordem jurídica. Objetividade e um esforço intelectual de melhor compreender as mudanças ou, melhor dizendo, o encaminhamento para as mudanças, num cenário regional, são uma preocupação central nesta obra coletiva, uma reflexão a um desafio.
A desregulamentação em várias áreas, preconizada pela OCDE, num mundo globalizado, impõe novos arranjos do ordenamento jurídico que, segundo Norberto Bobbio, para além de ser uma unidade, constitui um sistema, neste caso um sistema aberto que implica em capacidade de adaptação.
O Mercosul, constituído por meio do Tratado de Assunção (1991), após uma fase de transição que vai até o final de 1994, não só tem ainda um longo caminho a percorrer, fases a serem vencidas, como os seus parceiros, mesmo os maiores, não dispõem da capacidade financeira dos principais membros da União Européia. Cabe salientar o destaque que a imprensa sul-americana vem dando às dificuldades e conflitos surgidos no relacionamento interno no Mercosul, principalmente entre a Argentina e o Brasil, anunciando, de forma catastrófica, esses acontecimentos como complicadores que poderiam levar a uma mudança de rumos do projetado Mercado Comum do Sul. Ora, quem segue de perto a evolução do processo integrativo europeu sabe, perfeitamente, que a tomada de decisões ou, em alguns casos, a sua aplicação, não segue uma trajetória linear.
O encantamento pelo alargamento do Mercosul — no estágio futuro de mercado comum —, é bom advertir, pode ocasionar uma política de geometria variável e gradualista, em que os sistemas de integração poderiam variar em face dos casos concretos, destacando fragilidades.
O Mercosul, hoje, já é um processo irreversível. Como é natural, apresenta dificuldades, quer em relação à sua agenda interna, quer em relação à agenda internacional. O conhecimento e aprofundamento dos temas, objeto desta obra coletiva, é de fundamental importância para os agentes dos atores oficiais e para a sociedade civil em geral, e para apreender aspectos dos condicionamentos, daqueles, no processo de negociação, quer decorrentes de imposições domésticas, quer como resultado de uma abordagem pluralista no campo das relações internacionais, na perspectiva de uma negociação continuada da natureza integrativa. As medidas externas, na sua dupla vertente política e econômica, interativamente, são definitórias.
Entre os objetivos estratégicos atuais do Mercosul, evidenciamos o interesse pelo aumento de investimentos estratégicos e uma crescente inserção no comércio internacional.
Do ponto de vista jurídico, esta obra coletiva torna-se uma leitura necessária para quem busca, na prática, conhecer, no atual estágio de evolução do processo integrativo, o regime de concorrência, o embasamento legal em matéria contratual, a aplicabilidade dos direitos humanos, do direito ambiental, a solução de controvérsias compreendendo a arbitragem e o Tribunal, o Direito da Concorrência, até de problemas relacionados com a livre circulação de jogadores de futebol no Mercosul, entre outros temas abordados.
A profundidade da obra, a erudição e maturidade com que são tratados os temas ora apresentados, aliado à capacidade jurídica do organizador, Professor Paulo Borba Casella, por excelência um humanista, imprimem um sentido dinâmico a este trabalho coletivo que, volto a frisar, tem por objetivo surpreender o estágio atual do processo de evolução do Mercosul.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Análise das Relações Económicas no Mundo Lusófono - A Economia Brasileira

A Economia Brasileira

Breve contextualização histórica
Ao pensarmos a evolução da economia brasileira, especialmente no último quartel do século XX, é indispensável tomarmos em atenção a preciosa contribuição que o autor Borges Macedo elabora na sua obra As Relações Luso-Brasileiras: Uma década de expansão das relações económicas, 1992-2002. Nela nos basearemos para referirmos os marcos mais importantes que caracterizam a economia brasileira até ao presente.
Como o próprio autor indica, o Brasil sofreu uma evolução atípica àquela dos restantes países Sul-Americanos: enquanto podemos observar uma constante e gradual abertura das várias economias ao mercado internacional, o Brasil testemunhou períodos de estagnação, e outros tantos de recessão nessa mesma abertura ao exterior (ver Anexo 2.VI). São de apontar diversos factores que contribuíram para esse fenómeno, mas aquele que se torna premente em qualquer análise conjuntural regional da América do Sul, teremos necessariamente que entender o peso económico, demográfico e territorial que o Brasil representa. Desta forma, esse crescente encerramento das suas fronteiras e permeabilidade dá-se sobretudo ao nível do crescimento do mercado interno, que ao ganhar mais relevância, estabilidade e índices de produtividade e riqueza, permite-lhes um maior afastamento em relação às suas dependências sócio-económicas com o exterior. O objectivo tendencialmente manifestado é aquele de procurar um equilíbrio na balança de pagamentos pelo investimento na infra-estrutura económica nacional em matérias basilares nos três sectores económicos (ver Anexos 2.IX e 2.X), enquanto que se procede simultaneamente à negociação da sua enorme dívida externa, e substituição de importações por produção interna.
No entanto, a linha de crescimento económico do Brasil ao longo de todo o século XX nem sempre demonstrou a estabilidade que em outro caso poderíamos prever para uma economia com as suas potencialidades. Muito embora seja frequentemente referido como o país cuja economia foi a segunda que mais cresceu em todo o século (ver Anexo 2.V), foi pautada por períodos de considerável instabilidade e perdas de recursos humanos e económicos. Desde logo apontaríamos as consequências que as Guerras Mundiais trouxeram para este sub-continente, dispersando as atenções do grande gigante económico do Norte, os EUA, para outras regiões económicas de maior confluência. Com efeito, a maioria dos projectos de integração Sul-Americanos resultam de um conluio das vontades privadas dos vários Estados que, perante situações de graves dependências externas e fracos desempenhos económicos internos, são forçados e procurar ao nível regional um tipo de enquadramento de relações que lhes permitam reduzir dependências com economias exteriores ao sub-continente, e assim estimularem uma esfera de co-prosperidade assistida e cooperante como forma de combater um subdesenvolvimento crónico (ver Anexo 2.VIII).
Com a Grande Depressão de 1929, o Brasil sofreu aquele que seria o primeiro grande impulso em direcção à industrialização e subsequente internacionalização dos seus mercados em outros sectores que não o agrário. Face a um crescimento da indústria e serviços, rapidamente potenciou os seus índices de crescimento para valores acima dos 5% ao ano.
Desta forma, enquanto o Brasil e restantes países lucraram marginalmente com os sucessivos avanços do processo designado por globalização, sofreram em muito maior grau as recessões que esse processo enfrentou ao longo dos tempos, forçando-os pois a estabelecer mecanismos de amortecimento que lhes permitissem assegurar um nível mínimo de sustentabilidade aos seus projectos económicos, mesmo que bilateralmente.
Não obstante, e para além das Guerras Mundiais, a instauração de um regime ditatorial em 1960, resultado de uma séria instabilidade político-económica nacional, vem representar um período de especial importância na história económica brasileira. Como indica o mesmo autor, a própria doutrina do regime assentava numa preponderância do nacionalismo, assim contribuindo para a fomentação de um espírito de sistema encerrado sobre si mesmo, o que resultou num exacerbar dessa tendência isolacionista brasileira (ver Anexo 2.I, 2.II e 2.III). E de facto, assim foi até à queda do regime em 1985, findo o qual observamos uma evolução em direcção a uma economia de mercado neo-liberal, com sucessos ao nível da negociação da dívida externa, afirmação da estrutura económica nacional tanto ao nível doméstico como regional, e inclusive de um começo de projecção de alguma influência económica sobre o hemisfério Sul, com diálogos a serem estabelecidos em vários países africanos, nomeadamente aqueles que possuem recursos energéticos vitais ao crescimento económico. Assim, tudo aponta para uma maior participação e integração no sistema económico mundial, e emergência da importância da sua economia para o mesmo.

Caracterização das potencialidades e vulnerabilidades
O Brasil é o quinto maior país do mundo em superfície, que por si só representa uma potencialidade ímpar na forma como se insere na economia mundial. Ocupando cerca de 45% de todo o território da América do Sul, apresentando simultaneamente a população mais numerosa, é um actor regional incontornável e uma potência mundial emergente. Em termos numéricos, possui sensivelmente 190 milhões de habitantes, 50% dos quais se encontram laboralmente aptos a desenvolver actividades produtivas, o que nominalmente se traduz por 97,7 milhões.
Na sua dimensão geográfica, ocupa 8,5 milhões de km2, possuindo contudo uma área arável muito reduzida, sobretudo devido à legislação existente que visa a protecção do património mundial da Amazónia, isto é, na ordem dos 7%. Em termos marítimos detém uma fronteira marítima de 7,5 mil km, representando geopoliticamente a potência charneira de todo o Atlântico Sul. Em matérias de recursos naturais, são abundantes o petróleo, ferro, fosfatos, madeira, bauxite, ouro, e cobre (ver Anexo 2.XI).
Na esfera económica, possui um Produto Interno Bruto (PIB) em paridade de poder de compra de uns impressionantes $1.655 triliões, embora o PIB per capita não ultrapasse $8,800. O sector de maior produtividade é o de serviços, com 65% do total, situando-se as indústrias em segundo lugar com 30% e, finalmente, a agricultura com 5%. O seu crescimento anual médio, em comparação com o PIB real é de 3,7% (ver Anexo 2.XII).
Em suma, assistimos a um conjunto de sinais contraditórios que ora puxam o Brasil para níveis e índices de produtividade semelhantes aos dos países ditos desenvolvidos, ora partilha de um conjunto de factores menos satisfatórios e aproxima-se daqueles em desenvolvimento. Por outras palavras, enquanto que o seu PIB em poder de compra é considerável, o seu PIB per capita é deveras reduzido. O mesmo poderíamos referir da sua taxa de crescimento, que à partida afigurava uma posição de grande bem-estar e prosperidade, mas que é, grosso modo, responsável pela amortização da dívida pública, representando 46% de todo o PIB.
Não é, portanto, descomprometida a classificação enquanto potência emergente com expectativa de adquirir uma maior preponderância e participação na economia mundial caso continue a mostrar sinais de reforma e inovação que permitam uma maior influência no contexto regional, especialmente no âmbito do Mercosul, assim como em todo o Atlântico Sul e, subsequentemente, no mundo. Com efeito, existem três níveis de análise que deveremos tomar em consideração enquanto pensamos a inserção económica do Brasil. Por um lado, e bem exemplificado pelas sucessivas iniciativas do Presidente Lula da Silva, é uma das principais prioridades nacionais a consolidação de uma economia em crescimento contínuo e respeitável, a partir da qual se poderá proceder à estabilização/redução da taxa de inflação, da taxa de juro, e subsequente amortização da dívida pública que ocupa uma porção substancial do seu PIB. Consequentemente, necessita ainda de estimular a construção de infra-estruturas numa rede nacional alargada que facilite a comunicação entre os grandes centros urbanos, e entre estes e as zonas rurais, para que se crie um diálogo mais eficiente entre realidades económicas díspares, aproveitando simultaneamente potencialidades particulares de cada Estado em proveito de outros.
Não sem as suas diferenças, o processo de desenvolvimento brasileiro poderá ser comparado àquele da China, na medida em que existem centros de capitalismo e produção de grande riqueza que tomam a dianteira na actualização do sistema económico brasileiro num mundo globalizado, enquanto se procuram encontrar políticas macroeconómicas que ajudem a uma melhor coesão e eficácia dos diversos quadrantes económicos internos, estabilizando e permitindo o crescimento dos mercados para posterior aquisição de vantagens negociais de valor acrescentado em matérias de investimentos, balança de capitais, balança comercial, taxas cambiais, etc.
Em segundo lugar, o Brasil prossegue ainda uma política marcadamente regional na forma como enceta os seus esforços multilaterais e bilaterais internacionais ao longo da última década. Sendo um de dois pólos locomotores do bloco regional de integração Mercosul (ou Mercado do Sul), juntamente com a Argentina, o Brasil esforça-se por transformar as suas inerentes potencialidades económicas em influência político-económica de jure em cooperação com os seus vizinhos regionais, instrumentalizando as vulnerabilidades destes em benefício recíproco. Isto é, tendo como referência a existência da maior dívida regional do mundo, ultrapassando inclusive aquela existente em toda a África Sub-Sahariana, a América do Sul enfrenta múltiplos desafios no seu caminho em direcção ao desenvolvimento e prosperidade. Contudo, diversos países contribuem de diversas formas, por vezes unilateralmente, outras multilateralmente, fazendo-se valer das suas potencialidades para potenciar os seus lucros através da necessidade derivada das vulnerabilidades dos restantes países. Nesta óptica, não só representa o Mercosul um marco incontornável em todos os fluxos comerciais deste sub-continente, como o próprio Brasil é ele próprio responsável em grande parte pela dinâmica positiva que este bloco representa em todas as Américas. Assim, graças aos seus relativos avanços no sector dos serviços, e não só, consegue projectar a sua influência num contexto regional alargado, e assim contribuir para a aceleração do seu crescimento (ver Anexo 2.IV).
Para finalizar, o terceiro nível de análise respeita toda a comunidade internacional como o espaço geográfico não abrangido pela América do Sul, e dentro deste, as potências mundiais e aquelas em ascensão. Como todo o país com uma agenda internacional, o Brasil procura junto de outros importantes actores económicos internacionais o estabelecimento de laços de cooperação que permitam uma maior diversificação das suas importações e exportações, à medida que atrai IDI e estimula a internacionalização dos agentes económicos nacionais. Nesta lógica podemos interpretar as suas interdependências comerciais com países como os Estados Unidos da América (17.8% exportações; 16.2% importações), a Argentina (8.5% exportações; 8.8% importações), China (6.1% exportações; 8.7% importações), a União Europeia (10% exportações; 8% importações), entre outros.

Um novo “petropopulismo”?
O termo “petropopulismo” tem sido comummente referido na caracterização da condução da política externa venezuelana sob a governação do Presidente Hugo Chávez. De forma sucinta, o petropopulismo diz respeito a um regime de governação interna que assenta sobretudo na construção de uma realidade virtual de bem-estar e prosperidade, assente em divisas da produção e comercialização de petróleo em mercados internacionais sem que, com isso, se contribua substancialmente para um investimento de fundo nas infra-estruturas sócio-económicas e políticas do país. Na figura de Chávez, o petropopulismo assume-se ainda como uma corrente de política externa desafiadora do status quo mas que, contudo, não lhe é uma ameaça prioritária nem pretende uma completa substituição.
Com efeito, é este o cenário que podemos observar na Venezuela, país cuja participação na Organização de Países Exportadores de Petróleo (OPEP), devido às suas enormes reservas petrolíferas e capacidade de extracção e produção, lhe reconhece um estatuto de certa forma privilegiado pela dependência que os restantes países da comunidade internacional partilham em relação à sua vantagem estratégico-energética. Não obstante, continuamos a observar uma fraca sustentabilidade económica extra-petrolífera, na qual subsistem altos índices de desemprego, de corrupção, aliando-se a deficiências nos sectores agrícola e de serviços, ao nível de investimentos e taxas de poupança, etc (ver Anexo 2.VII).
Por conseguinte, o novo petropopulismo relacionar-se-ia com a utilização da vantagem económica assente na energia petrolífera para atrair enormes quantidades de capital e investimento estrangeiro para sustentar a curto-médio prazo projectos reformistas e expansionistas no contexto regional e transregional em apreço. Caso se comprove a capacidade das jazidas brasileiras em abastecer a economia doméstica e ainda a permitir a exportação de petróleo, certamente que a dinâmica conferida ao Mercosul melhoraria tremendamente não só em termos quantitativos como qualitativos, permitindo ao Brasil a consagração enquanto potência regional efectiva e sem rivais imediatos, favorecendo a delimitação de outros interesses estratégicos exteriores à América do Sul, cujos recentes avanços diplomáticos deixam antever o fomento a um diálogo no Atlântico Sul, não só com outros países lusófonos como Angola, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde, como também com a referência económica da Nigéria, as potencialidades do Congo e África do Sul, e demais actores regionais africanos.
A lógica de contestação do status quo seria decididamente contraproducente face à possível prossecução deste objectivo estratégico, como aquela em decurso pelo “Chavismo”, mas a adopção moderada de uma economia que obtém grandes lucros provenientes da indústria petrolífera seria, indubitavelmente, uma vantagem à qual Brasília não poderia virar as costas.Para o mundo lusófono, ademais, as potencialidades provariam ser extremamente beneficiadoras de crescimentos económicos em consolidação, nomeadamente entre os países africanos, mas que para Portugal poderia significar uma vantagem de valor acrescido face aos seus parceiros europeus, cujos interesses recaíram expectavelmente nas mesmas potencialidades. Abstendo-se de um papel paternalista, que muitos jornalistas têm vindo a designar como a natureza dos interesses portugueses no Brasil, os lucros mútuos que poderiam advir da obtenção de uma preponderância nas relações energéticas Brasil-UE estimulariam a economia portuguesa a sair da sua crise, que aliás parece espalhar-se a toda a União, estimulando o diálogo em eixo Brasília-Lisboa-Bruxelas.