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Como não tenho o dom de ler pensamentos, me preocupo somente em ser amigo e não saber quem é inimigo. Pois assim, consigo apertar a mão de quem me odeia e ajudar a quem não faria por mim o mesmo.
Quem não lê, não pensa, e quem não pensa será para sempre um servo.


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quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

O Brasil e as relações Sul-Sul. Perspectivas do poder mundial

O Brasil e as relações Sul-Sul. Perspectivas do poder mundial*
Paulo Roberto Daltro de Carvalho**


Resumo
Este artigo dedicará algumas reflexões para a cooperação do Brasil com novos espaços internacionais, as relações Sul-Sul com outros países considerados "potências emergentes" e system-affeting (que dispõem de recursos suficientes para, junto com atuação internacional ativa, afetar o andamento de certos temas da política internacional), em outros continentes como é o caso da África do Sul, Índia, China além da Rússia e a posição do Brasil como liderança regional. Questiona-se finalmente como incrementar a integração regional.

Palavras-chave: Brasil; África do Sul; Índia; Relações Sul-Sul; Comércio Internacional; Política Externa.

Introdução
A análise das relações do Brasil com países aspirantes a uma posição de proeminência na ordem mundial, como Índia e África do Sul, tem implicações teóricas importantes. A globalização gerou espaços para a projeção de potências regionais, líderes de blocos econômicos, o que contribui para reforçar a possibilidade de formação de um sistema mundial multipolar, em lugar de uma neo-hegemonia norte-americana. O Brasil está no caminho certo ao buscar uma maior integração na economia mundial.
Assim, o estudo das relações do Brasil com estes países nos marcos Sul-Sul, se reveste de grande relevância. Mas é necessário ter em conta o desafio da ordem mundial pós-Guerra Fria, e particularmente, pós - 11 de setembro. Os desafios que os membros do G-3 vêm enfrentando criam um espaço comum de atuação. Por outro lado, é preciso desmistificar a crença de que se trata da retomada do "terceiromundismo", a adoção de uma diplomacia ideológica ou de um posicionamento conjunto que visa contestar a ordem mundial em seu conjunto. Como uma aliança política que é, tem conseguido se viabilizar em contínuo rearranjos.

O Brasil e as Relações Sul-Sul
Avançando com o diálogo sul-sul iniciado no governo FHC, a chancelaria do governo Lula buscou estabelecer um círculo efetivo de alianças estratégicas com Estados pares, a fim de que, juntos, os países subdesenvolvidos pudessem aumentar seu poder de barganha no sistema internacional. É esse o caso do relacionamento brasileiro com Índia e África do Sul, no âmbito do projeto IBSA (India, Brazil and South Africa), do fortalecimento das relações bilaterais com Rússia e China, e de sua participação, cada vez mais ativa, em grupos de articulação que unem países em desenvolvimento, como o G-20 e o G-4. Além da cooperação em setores complementares, esse incremento da coordenação política visa refletir-se em um aumento da influência do Brasil nas negociações multilaterais em que está envolvido, em especial as disputas travadas no âmbito da OMC.
O ano de 2003 confere diferenciada importância política a estas relações em função do surgimento do IBSA ou IBAS, do papel que passa a ser atribuído ao Brasil e à Índia nas negociações conclusivas da rodada de Doha na OMC, bem como do lançamento de suas candidaturas a membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
O ponto inicial para a distinção do ano de 2003 dos demais é o surgimento do Fórum de diálogo Índia, Brasil e África do Sul (IBAS) e o lançamento do G-20, grupo de países em desenvolvimento com foco em políticas agrícolas e atuação baseada na Agenda para o Desenvolvimento de Doha. Destaca-se ainda, a importância das articulações do G4 (Brasil, Índia, Alemanha e Japão) com vistas à obtenção de um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
O IBAS, organismo baseado em uma concepção de cooperação Sul-Sul, é uma iniciativa promissora em muitos aspectos. Em termos políticos, a coalizão tem o potencial de assegurar um protagonismo para seus membros, proveniente da concertação de seus interesses e posicionamentos em fóruns multilaterais. Em termos econômicos, o fluxo trilateral pode aumentar trazendo, além dos supostos benefícios advindos do desvio do atual comércio com o norte para o sul, a materialização de uma união conformada por elos quase que indissolúveis. No que tange à cooperação para o desenvolvimento conjunto de tecnologia, as iniciativas até então realizadas demonstram bons prognósticos de avanço, respeitando-se os limites da “generosidade” em ceder know-how de cada um dos países. E, por último, mas não menos importante, o IBAS incorpora o enfoque relativo à mitigação de problemas socioeconômicos comuns aos três, sendo este um aspecto de grande valia para impulsionar o desenvolvimento destes países.
Ao discursar para os representantes de países do G-20 durante a V Conferência Ministerial da OMC, realizada em Cancún, entre 10 e 14 de setembro de 2003, de acordo com a idéia de configurar uma nova geografia do comércio mundial, o presidente Lula aproveitou a oportunidade para afirmar que esse novo tipo de articulação deveria inspirar novas ações também em outros tabuleiros, além dos fóruns internacionais já consolidados como a OMC e a ONU para ampliar o nosso intercâmbio recíproco, especialmente para a intensificação do comércio Sul-Sul. Nessa perspectiva, a diplomacia do governo Lula articulou com Índia e África do Sul o IBAS. Entre outros propósitos, essa parceria visa consolidar um bloco trilateral Sul-Sul para o fortalecimento tanto da capacidade política nas negociações comerciais internacionais desses países na OMC frente aos partners desenvolvidos quanto busca a reforma da ONU, que deverá ser mais democrática e voltada para as prioridades dos membros, a mudança na representação no Conselho de Segurança com suas respectivas emergências para que o órgão torne-se representante efetivo da comunidade global, a redução da pobreza como meio para aumentar a paz e estabilidade internacional (IBAS, 2008).
Para o chanceler brasileiro, Ministro Celso Amorim (2003), Cancún “marca um ponto de inflexão na dinâmica interna da OMC onde, tradicionalmente, o que era decidido pelas grandes potências comerciais era visto como o consenso inevitável. (...) As postulações da maior parte da humanidade não puderam ser ignoradas. As negociações se processarão de maneira mais equilibrada e menos unilateral”. Isso ocorreu “Graças a um esforço conjunto de 22 países em desenvolvimento, coordenados pelo Brasil, do qual participaram países grandes e pequenos de três continentes” (Amorim, 2003). Essas declarações indicam que a Conferência de Cancún pode ter representado o momento inaugural da proposta do governo Lula de adensamento do diálogo e das parcerias Sul-Sul em busca de uma mudança da geografia comercial e política do mundo favorável aos países em desenvolvimento. A convergência entre Brasil, Índia e China permitiu que esses países liderassem uma coalizão, a qual, mais tarde, ficou conhecida como G-20 e concentrou sua atuação em agricultura: tema central da Agenda de Desenvolvimento de Doha.
Da perspectiva do atual governo, a cooperação Sul-Sul não substitui o relacionamento com os EUA e a União Européia, mas representa uma oportunidade de ampliação do comércio exterior. O governo avalia que a proporção atual do comércio do Brasil com os EUA e a União Européia já teria alcançado um valor limite a partir do qual os incrementos seriam apenas marginais. Ao contrário, os novos mercados do Sul apresentariam grande potencial por serem economias com complementaridades naturais.

As expectativas do Brasil e o IBAS
As mudanças implementadas nas políticas externas sul-africana e brasileira a partir dos anos 1990 tem sido acompanhadas por diplomatas e acadêmicos. A África do Sul e o Brasil são grandes países em vias de desenvolvimento e estão se posicionando como potências regionais, constituindo espaços qualificados e pólos específicos nos marcos de um sistema multipolar.
Em 2003, iniciou-se o estreitamento das relações entre os países IBAS. Este constituiu um encontro pioneiro de três países com democracias vibrantes, de três regiões do mundo em desenvolvimento e atuantes em escala global, com o objetivo de examinar temas da agenda internacional e de interesse mútuo. Nos últimos anos, notou-se a importância e a necessidade de diálogo entre países e nações em desenvolvimento do Sul. Estes três países representam as maiores democracias em cada continente (ou subcontinente) e que juntos representam uma população de 1,25 bilhão de pessoas.
A primeira reunião do IBAS em junho de 2003, que reuniu os chanceleres do Brasil (Celso Amorim), da África do Sul (Nkosazana Dlamini-Zuma) e da Índia (Yashwant Sinha), refletiu a amplitude da proposta. A agenda estava tenuemente delineada em torno de algumas matérias: a análise dos desdobramentos recentes da conjuntura internacional e o papel das Nações Unidas nesse contexto; temas sociais (combate à fome e cooperação Sul-Sul); negociações econômicas e comerciais, inclusive entre países em desenvolvimento; e coordenação em organismos multilaterais. Como resultado principal, a Declaração de Brasília, documento originado do encontro, apontava a criação de uma Comissão Mista para uma discussão mais aprofundada destes tópicos e ainda recomendava uma reunião de cúpula envolvendo os chefes de governo dos países envolvidos, que veio a ocorrer em 2006. As palavras da Ministra dos Negócios Estrangeiros da África do Sul, Nkosazana Dlamini-Zuma, ao final do encontro poderiam ser universalizadas como sendo a opinião pública geral a respeito de uma proposta que, de fato fora exageradamente alardeada, considerando-se sua incipiência e grau de dificuldade, mas que, no entanto, poderia ser viável.
Para o governo Lula, o G-3 tem, hoje, mais importância política que comercial, uma vez que o intercâmbio comercial com a Índia e África do Sul ainda é relativamente baixo. Contudo o apoio político destes países pode ser fundamental para que a política externa brasileira alcance objetivos importantes como a questão dos subsídios agrícolas na OMC.

Cenário Interno e estabilidade política
Os anos 2001-2005 assistiram a uma vitória política significativa no Brasil: a chegada do PT ao Poder Executivo pela primeira vez em sua história. Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o Executivo após vencer as eleições de 2002. A partir de 2004, as mudanças dentro do PT se fizeram mais notáveis, o período foi de grandes transformações para o Partido dos Trabalhadores (PT), o maior partido de esquerda brasileiro. Lula[1] desde o primeiro momento, foi contrário à política externa “presidencial” adotada por FHC, defendendo uma atuação independente e a serviço dos interesses da nação brasileira, coordenada pelo Itamaraty. Anunciou a disposição de contribuir para a democratização do processo de tomada de decisões neste âmbito, ao mesmo tempo em que priorizou a integração via Mercosul.
Sobre a Alca, mostrou-se preocupado com “os gravíssimos problemas que geraria para a região um acordo de livre comércio tal como o proposto pelo governo dos Estados Unidos em 1994”. Sua preocupação levava em conta “a grande assimetria existente entre os países e a falta de recursos e políticas tendentes a eliminar as grandes desigualdades socioeconômicas entre as regiões e os países”.
Como alternativa à proposta da ALCA, o então candidato do PT anunciou a disposição de aprofundar as negociações com os países da Comunidade Andina de Nações, ressaltando que o Brasil, “pela sua natureza de país continental que tem fronteiras com quase todos os países da América do Sul, tem condições de influir positivamente no processo de construção de blocos regionais, visando a objetivos de desenvolvimento e de democracia”.
O Governo Lula tem procurado demonstrar que os objetivos da diplomacia brasileira podem ser a um só tempo, universalistas e firmemente ancorados em nossa prioridade sul-americana. É este o espírito com que iniciativas inovadoras têm sido lançadas, como o foro trilateral entre Índia, Brasil e África do Sul (IBAS).

Negociações Internacionais e o Processo de Integração
A OMC é uma organização internacional fundada em 1995, com o objetivo de coordenar e administrar as regras do comércio internacional. Sua principal origem é o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT, na sigla em inglês), assinado em 1947 por um pequeno grupo de países interessados na liberalização do comércio mundial pela gradual eliminação de tarifas e barreiras não tarifárias, dentre os quais o Brasil.
A maior fragilidade econômica da América do Sul tornou o continente mais suscetível às pressões das grandes potências nas instituições de crédito internacional e nas negociações da Rodada Uruguai do GATT. O modelo do Estado desenvolvimentista entrou em colapso, sob fogo cerrado de diversas direções. O FMI e o Banco Mundial impunham como condicionalidades de empréstimos a abertura da economia e a privatização. Os acordos comerciais também impossibilitavam antigas salvaguardas de proteção à indústria e à agricultura, ao mesmo tempo em que colocava em questão a liberalização dos promissores mercados de serviços, nos quais os sul-americanos eram pouco competitivos.
Desse modo, a guinada para um modelo de integração baseado no “regionalismo aberto” dá-se em um quadro de intensa fragilidade internacional. A política externa brasileira volta-se para a América do Sul em busca de uma área de atuação que lhe permita enfrentar melhor a competição crescente.
A criação do Mercosul não deve ser considerada como uma ação diplomática isolada, mas sim, como o resultado de um processo longo de se aproximar os países: Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Na década de 1970, percebe-se que diversas barreiras de natureza política e econômica inviabilizaram o aprofundamento do processo de integração na América Latina, nota-se que um bom exemplo foi à questão entre Brasil e Argentina sobre o aproveitamento dos recursos hídricos da Bacia do Prata que durou anos.
A diplomacia brasileira incluiu em sua agenda um projeto mais claro de construção de uma liderança regional articulado à segurança regional, à defesa da democracia, aos processos de integração regional e às perspectivas de desenvolvimento nacional.
A participação brasileira nas Forças de Paz do Haiti também se vincula às iniciativas brasileiras de consolidar sua liderança na região e reforçar a cooperação sul-sul. Neste caso, Brasil lidera uma força de imposição de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) composta por tropas de diversos países da região.
A liderança do Brasil na América do Sul é um tema delicado e tem sido freqüentemente abordado na literatura acadêmica. Quando se trata da estabilidade e do equilíbrio do continente, a importância do Brasil é incontestável. Quando, no entanto, o enfoque passa a ser o de contribuir para a maior integração econômica, social e cultural da região.
A atuação brasileira nesta área conviveu também com algumas tensões. A partir do incremento de sentimentos nacionalistas, alguns países vizinhos reivindicam concessões brasileiras no campo econômico. A nacionalização dos hidrocarbonetos levada adiante pelo governo boliviano, embora tenha afetado a Petrobrás, foi digerida pelo governo brasileiro e a diplomacia adotou uma posição pragmática. A ascensão do governo de Hugo Chávez na região com um projeto alternativo de liderança coloca um dilema para a política externa brasileira: como incluir a Venezuela no projeto brasileiro de integração e evitar que o presidente Chávez defina o ritmo do processo.
A necessidade da diplomacia brasileira de conviver com um dirigente também com pretensões de construção de liderança na região – com divergências de interesses e estilo, e com percepção e compreensão diferenciadas do cenário regional – pode dificultar a construção de uma aliança política mais sólida. Por fim, o Brasil expandiu seu comercio e investimentos em regiões do Sul. Combinou política e economia em perspectiva Sul-Sul com bons resultados.
O Brasil dos últimos cinco anos ganhou mais notoriedade internacional, virou-se com clareza para a sua própria região em um movimento que fortaleceu as instituições regionais, ao mesmo tempo em que não deixou de ampliar suas parcerias pelo mundo. As ambições brasileiras são muitas, e em várias ocasiões essa nova disposição gerou atritos com os seus parceiros mais próximos. Entre os mais importantes, estão os membros do Mercosul, em que é preciso cautela, no sentido de manter a dedicação necessária à continuidade do movimento de integração. Os desenvolvimentos observados parecem confirmar as escolhas da política externa brasileira, com a prioridade que ela deu desde o início do governo Lula à integração da América do Sul. Os defensores dessa política não precisam fazer muito esforço para apontar os avanços alcançados nessa direção. Nas palavras do mais autorizado dentre eles:

O crescimento das exportações do Brasil para a América do Sul no primeiro semestre de 2006 em relação aos seis primeiros meses de 2002 foi de 258%. Para o conjunto da América Latina, 220%, para o Mercosul, 332%. Um país que fez acordo com os EUA, como o Peru, importou 139% mais do Brasil este ano. No caso da Colômbia, que é muito ligada aos americanos, o aumento foi de 95% (O Globo, 2006). [2]

Não podemos dizer que os números absolutos por trás dessas taxas de crescimento são inexpressivos: em 2005, as exportações do Brasil para os países membros da ALADI (Associação Latino Americana de Integração) ultrapassaram a marca dos 25 bilhões de dólares, correspondendo a mais de 21% das exportações totais do país, 2% a mais do que a participação dos Estados Unidos.
Com a integração da infra-estrutura física, as medidas de facilitação do comércio e o entrelaçamento crescente entre as economias da região, a América do Sul tende a se constituir como um mercado cada vez mais importante para as exportações brasileiras, diminuindo significativamente o risco para o país de bloqueios eventuais nos processos de negociação em que está engajado. Mas na América do Sul, também, os ventos são de mudança, e a mudança em curso no subcontinente cria novas oportunidades, mas igualmente novos desafios para os projetos generosos de integração.
Reforçar o Mercosul significa atrair os países andinos para dentro do acordo, estreitar os laços com a União Européia, expandir o comércio com a China, a Índia, com a Ásia de um modo geral, com a África do Sul e com todos os países onde haja espaço para crescer.

Conclusão
O IBAS é uma coalizão Sul-Sul emblemática, pois é constituída por três países em desenvolvimento indicados pela literatura como pertencentes a qualquer das inúmeras categorias destinada a expressar a noção de condição intermediária no sistema internacional – potências regionais, potências médias, países intermediários ou mercados emergentes. Esta especificidade possibilita avaliar o perfil, as bases da formação e as potencialidades de uma coalizão "entre potências médias do Sul".
O IBAS é importante a fim de que seja mantida a retórica desenvolvimentista, já que em termos internacionais, o componente político de suas relações externas vem sendo cada vez mais associado à diplomacia econômica, em função do processo de globalização.
A política externa do governo Lula evidencia, com clareza, que a diplomacia não se deve resumir ao comércio internacional. A variável comercial, contudo, tem sido cuidadosamente acompanhada e implantada em novos setores - aumentando os meios financeiros e outros destinados ao seu desenvolvimento - em conexão com os demais temas da agenda internacional, tais como a responsabilidade do Brasil em face à segurança internacional e regional, a continuação e adensamento do amplo campo de cooperação internacional, no plano bilateral, regional e multilateral, no desenvolvimento de políticas e práticas de concertamento diplomático em vários campos, numa abrangência do que se define por agenda internacional.
Desta forma, o balanço da política externa brasileira sob a condução do Presidente Luis Inácio Lula da Silva é positivo. E isso porque o esforço adaptativo tem sido conduzido com base no reconhecimento de um legado histórico a partir do qual se redefinem prioridades e instrumentos. Portanto, os elementos novos da política externa do Governo Lula não devem ser caracterizados ou reduzidos a simples mudança de estilo associada à inegável disposição à assertividade. Seus elementos substantivos mais destacados não são realmente inéditos. Mas a forma com que objetivos, prioridades e instrumentos são revistos e reorganizados resulta em um perfil efetivamente distinto dos governos anteriores, mesmo sem necessariamente incorrer em rupturas ou grandes inovações.

[1] Entrevista de Luiz Inácio Lula da Silva a Política Externa, vol. 11, n. 2, setembro - novembro, 2002.
[2] Entrevista concedida pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Celso Amorim, ao jornal O Globo, 29/10/2006.


* Tema Final proposto para a disciplina de “Relações Sul-Sul” do curso de RI.
** Aluno do Curso de RI do PT. Gestor de TI. Membro da Executiva Municipal do PT de Simão Dias/Sergipe.


Referências Bibliográficas
AMORIM, Celso. “Discurso do ministro de Estado das Relações Exteriores, embaixador Celso Amorim”. Por ocasião do Dia do Diplomata. Brasília, 18/9/2003.

GONÇALVES, J. B. Mercosul após 2002: Propostas a partir de um testemunho pessoal. Em Clodoaldo Hugueney Filho e Carlos H.Cardim (orgs.) Grupo de Reflexão Prospectiva sobre o Mercosul. IPRI/FUNAG, Brasília.

MACHADO, João Bosco. MERCOSUL: processo de Integração – Origem, Evolução e Crise. 8 ed.. Rio de Janeiro: FUNCEX, 2000.

Conferência Nacional de Política Externa e Política Internacional – I CNPEPI. O Brasil no mundo que vem aí. Rio de Janeiro: Fund. Alexandre de Gusmão, 2006.

Conferência Nacional de Política Externa e Política Internacional - II CNPEPI. Seminário América do Sul. Brasília: Fund. Alexandre de Gusmão, 2007.

Maria Regina Soares de Lima e Marcelo Vasconcelos Coutinho. A Agenda Sul-americana: Mudanças e Desafios no Início do Século XXI. Brasília: Fund. Alexandre de Gusmão, 2007.

IBSA. Disponível em: http://www.mre.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1938&Itemid=351. Acessado em 02/12/20008.

Vários Autores. O Brasil e a América do Sul: desafios no século XXI. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão: Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, 2006.

A Crise do Sistema Capitalista Norte Americano e suas conseqüências econômicas

A Crise do Sistema Capitalista Norte Americano e suas conseqüências econômicas*
Paulo Roberto Daltro de Carvalho**


Resumo
Quem tem acompanhado a nova manifestação da crise geral do capital em suas dimensões econômicas, sociais e políticas, tendo por epicentro basilar os EUA, voltou a conviver com o fantasma da crise iniciada em 1929: o crash financeiro, o suicídio, a depressão econômica, o desemprego, a fome, a corrupção, o fascismo e a guerra mundial. Diante deste fato, o problema que se impõe a todos que sofrem a opressão ou contestam o capitalismo é: o que fazer?


Palavras-chave: Economia Internacional; Política Internacional; Sistema Capitalista; Estados Unidos.


Introdução
As causas objetivas da crise vigente, intrínsecas ao próprio curso da acumulação do capital, têm suas particularidades na presente etapa. A aplicação das políticas neoliberais desatou um imenso volume inimaginável de capital fictício, que passou a atuar intensamente sobre a esfera da produção.
Em resumo, a realidade mundial é caracterizada, por um lado pela ofensiva imperialista e dominância neoliberal e, por outro, pela resistência crescente dos povos e nações em vários níveis e pelo surgimento entre os países em vias de desenvolvimento de pólos e blocos contra-hegemônicos, pela rápida ascensão econômica da China e pela recuperação da Rússia e de outros pólos dinâmicos na chamada periferia do Capitalismo. Também nessa situação global, se destacam importantes fracassos da ofensiva do imperialismo norte-americano nas suas guerras de ocupação e domínio. Essas tendências globais já vêm conformando um processo contraditório que indicam a existência de um mundo em transição, que expressa no conjunto um quadro mundial de declínio relativo da hegemonia unipolar dos EUA.

A Crise financeira e econômica do capitalismo
É natural que setores das oligarquias financeiras, por inércia ideológica e volume do seu capital, não admitam o desmoronamento, em tão pouco tempo, do mundo projetado: de ditadura do pensamento único neoliberal, de democracia política como valor universal e de unipolaridade mundial, sob a hegemonia dos EUA. Destes se podem esperar tão somente soluções de alto risco para toda a humanidade. Assim, cabe aos setores mais conscientes em todas as partes do mundo a habilidade necessária para conduzir este processo de transição da forma histórica da sociedade, em todos os seus aspectos fundamentais, capaz de superar esta pré-história no desenvolvimento humano. Mas exatamente neste momento de ruptura de paradigmas no sistema capitalista, a ausência de uma formação socioeconômica consolidada e de um movimento mundialmente organizado com visão estratégica para toda humanidade e força capaz de dissuadir ações da reação imperialista, se faz ressentir mais que em qualquer outro momento da história, projetando assim um novo período de grandes comoções políticas e sociais e o perigo de uma catástrofe mundial e humanitária.
Em uma matéria[1] publicada para promover seu novo livro acabado de publicar: “A Guerra dos Três Mil Milhões de Dólares”, os cientistas Stiglitz e Linda Bilmes da Universidade de Harvard, calculam que a guerra de Bush no Iraque custou só aos EUA, três trilhões de dólares. Neste estudo estão apenas incluídos os gastos bélicos diretos que se refletem no orçamento. Mas, para se chegar ao custo real, deve-se acrescer ainda os custos propriamente econômicos, que são calculados com base nos efeitos macroeconômicos e econômico-planetários da guerra, em pelo menos mais 3 trilhões de dólares. Segundo os dois cientistas, este montante total de 6 trilhões de dólares, que equivale aproximadamente ao valor de todas as reservas de ouro e divisas mundiais, é uma estimativa conservadora. Todos os meses os EUA precisam desembolsar mais de 16 bilhões de dólares em custos correntes para as guerras do Iraque e do Afeganistão, além dos 439 bilhões de dólares do orçamento de defesa. Com a privatização da guerra, 180.000 mercenários das empresas de segurança contratados para o Iraque pelo Pentágono custam, em média, dez vezes mais do que custa um G.I. regular (soldados de infantaria) – 400.000 dólares por ano, contra 40.000.
O aparato militar bélico e repressivo não impulsiona apenas a falência do império dos EUA, ele também explica a base fundamental e a essência da crise do capital que se tornou visível nas últimas 4 décadas (1973, 1980, 1989, 1998 e 2007) elevando-a da condição de crise do modo de produção social para uma crise ambiental que ameaça a vida no planeta. A crise energética, que se anunciou em 1973, não foi uma crise – como muitos pensavam – refletindo apenas as contradições sociais da política de monopólio dadas à nova composição da OPEP em função das transformações políticas no mundo árabe. Ela, sobretudo, enunciou as novas condições técnicas e de valor na composição orgânica do capital (a relação entre capital variável e capital constante - homem/máquina) que a guerra-fria (a corrida armamentista e aeroespacial) aportaria à economia mundial, dando lugar à revolução informacional, como expressão máxima do que se convencionou chamar revolução científico-técnica.
Em um outro ângulo podemos analisar a importância da estrutura militar na crise geral do sistema: como setor dinâmico de alto custo que, diante do fim da guerra-fria exige sua realização, revelando-se como crise de superprodução de equipamentos militares e de alta tecnologia. Neste contexto, os produtos tecnológicos do complexo industrial-militar se transplantam para toda a economia, com eles a revolução informacional, elevando a capacidade produtiva do sistema a uma escala planetária e, dialeticamente, às contradições que negam sua base material de existência social: o valor-trabalho e a contradição capital-trabalho; impulsionando o declínio da taxa de lucros, o crescimento da superpopulação relativa (exército industrial de reserva), logo a manifestação da Lei Geral da Acumulação Capitalista.


A situação econômica mundial e sua crise atual
A crise econômica mundial atual, iniciada pelo estouro da bolha imobiliária no setor de hipotecas subprime nos EUA – empréstimos de alto risco – em termos de economia nacional o estímulo ao crédito e ao consumo implica estímulo à produção. E quando este estímulo ou facilitação de crédito se volta prioritariamente para o setor imobiliário e da construção civil, isto indica que os demais setores da economia já haviam chegado ao limite. O desdobramento natural deste processo é, por um lado, o crescimento artificial do consumo e, conseqüentemente, da produção que nas condições atuais de globalização, vai sempre além dos limites absolutos de consumo da sociedade e formando bolhas financeiras e dos movimentos especulativos até explodi-las como ocorreu recentemente. Não necessitamos dizer que a especulação sobre os títulos de hipoteca, seja pelos bancos, seja pelos fundos de hedge, no mercado derivativo inflou os valores dos imóveis, logo a representação de valor dos mesmos nas bolsas. E também que o valor das ações das empresas do setor e relacionadas ao mesmo, igualmente sofreram esta deformação, reduziu o valor real de todas as empresas que detinham os títulos e, finalmente, que toda a economia americana sustentou o prolongamento do seu ciclo com base nesta espécie de bolha de todas as bolhas.
Quando passou-se a registrar o crescimento da inadimplência das pessoas físicas, durante o ano de 2007, resultando na perda de um milhão de moradias, a elevação da taxas de juros logo denunciou a crise. O freio no crédito com a alta dos juros, aprofundou a falência das pessoas físicas, logo refletindo a queda na demanda por imóveis e a queda no valor dos mesmos, desencadeando a falência das empresas mais comprometidas diretamente com o processo das hipotecas. Então os fundos de hedge descarregam sua posição em títulos imobiliários e a bolha estoura e com ela começam a estourar uma a uma as bolhas nos diversos setores.
O crash das bolsas em todo o mundo, segundo as notícias que oscilam todos os dias, já torram cerca de 50% da montanha de capital fictício em circulação atualmente. Este montante ultrapassa em mais de três vezes o valor do PIB mundial, ou seja, 167 trilhões de dólares; isto fora o mercado derivativo mundial, a praia dos hedges funds, estimado em um valor entre 9 a 10 vezes maior que o PIB mundial de 54,3 trilhões de dólares. Para os mais otimistas, com base nos pacotes baixados pelos governos dos EUA, França, Inglaterra, Alemanha, Japão, Espanha, Rússia, a soma pode chegar a 4,4 trilhões de dólares. Isto pode representar por um lado, a expansão da base monetária ainda maior em contradição à recessão mundial prevista por todos os países diante da retração dos investimentos produtivos, que segundo o relatório da ONU apresentado em maio de 2008. Neste ano o PIB será de apenas 1,8% e para 2009 em torno de 1,4%. Os Estados Unidos seu PIB cairá para -0,2% já em 2009 chegará no máximo a 0,2%. Da queda do consumo global, enfim, configurando-se o movimento de descenso do ciclo econômico mundial. Por outro lado, deveremos ter a futura guerra comercial e financeira entre os países mais desenvolvidos no capitalismo e destes com os países ditos “emergentes”, a deflação das moedas e dos preços das commodities, para através das importações manterem a atividade econômica, ao passo que os preços dos alimentos continuarão a sofrerá aumento. A OIT divulgou um relatório em que chama atenção para a taxa de desemprego que crescerá, estimando o total de perdas de postos de trabalho em 20 milhões e aumentando para cerca de 100 milhões o número dos que recebem até um dólar por dia; a FAO divulgou relatório chamando atenção para o crescimento da fome e pobreza mundiais. O recente relatório da OCDE já aponta que as desigualdades aumentaram de 7% a 8% em relação aos anos 1980, e a quantidade de pobres de 9,3% para 10,6% no conjunto da população, enfim, a crise social se ampliará e com ela as crises políticas em todos os países.
Entretanto, nada disso foi capaz de propiciar a estabilidade ao sistema ou impedir suas crises cíclicas, muito menos vencer as contradições basais do capital e as novas contradições que brotam neste momento histórico, cujas características principais Lênin em síntese definiu:

Se fosse necessário dar uma definição o mais breve possível do imperialismo, dever-se-ia dizer que o imperialismo é a fase monopolista do capitalismo. (...) Os monopólios, a oligarquia, a tendência para a dominação em vez da tendência para a liberdade, a exploração de um número cada vez maior de nações pequenas ou fracas por um punhado de nações riquíssimas ou muito fortes: tudo isto originou os traços distintivos do imperialismo, que obrigam a qualificá-lo de capitalismo parasitário, ou em estado de decomposição. Cada vez se manifesta com maior relevo (...) a formação de “Estados” rentiers, de Estados usurários, cuja burguesia vive cada vez mais à custa da exportação de capitais e do “corte de cupões”. Seria um erro pensar que esta tendência para a decomposição exclui o rápido crescimento do capitalismo. (LÊNIN, 1981. p. 664).

Marx ao explicar a crise do capital afirma: “A razão última de todas as crises reais é sempre a pobreza e a restrição ao consumo das massas em face do impulso da produção capitalista a desenvolver as forças produtivas como se apenas a capacidade absoluta de consumo da sociedade constituísse seu limite.” (MARX, 1988. p. 24). O Estado passa a intervir na economia – com relativa freqüência – nas transações privadas e coletivas, causando espécie à sociedade e ao empresariado brasileiro planejando-a e regulando-a através de políticas (tributária, fiscal, monetária e salarial) e de investimentos (na seguridade social e infra-estrutura), visando equilibrar os desníveis entre produção e consumo.


A Crise imperialista e suas guerras e luta de classes pelo mundo
O capitalismo vive um movimento contraditório: ele completa o seu domínio mundial sobre povos, nações, espaços, modos de produção e atividades num processo não de boom sistemático, mas de crise e contração recorrentes. A verticalização toma o lugar da horizontalização, que encolhe a produção efetiva e o mercado e a exclusão substitui a inclusão, tudo isso na forma de organizar o trabalho e a produção no interior da relação trabalho-capital no seu estágio atual, após a crise do fordismo e da social-democracia e a emergência da reestruturação produtiva e seu corolário político, o neoliberalismo. Por isso, trata-se de uma crise só, ao longo da qual existem momentos para cima e para baixo, mas sempre em torno de uma linha média de crise e de contração de longo prazo — uma crise diferente das anteriores, fruto de um estágio de saturação objetiva dos pressupostos da produção e do mercado. A ativação da acumulação pela via fictícia, o inusitado desemprego mundial que faz o consumo retrair-se ao extremo, bem como a recorrência aos incentivos políticos à produção são, apenas, algumas, entre muitas outras provas, de que esses pressupostos estão a sofrer um processo de exaustão.
Esta crise, com as características de um sistema financeiro globalizado, gigantesco, desregulado e indomável, reduzindo a demanda social solvente, como acaba de acontecer nos EUA, e reforça os graves problemas sociais em todo o mundo. Com isso, se encontram a crise de superprodução e a crise financeira, formando uma só crise universal.
Trata-se de uma crise de superprodução generalizada clássica, mas é mais do que isto: é uma crise diferente de todas as crises antecedentes, pois se trata de um estágio em que o capitalismo devasta, sem cessar, suas próprias bases de existência e acumulação ampliada, tudo isso em escala mundial crescente; uma crise de início e aceleração do esgotamento da própria ordem do capital, do modo de produção capitalista, que teve de cumprir a mais plena evolução e mundialização imperialista para finalmente produzir suas próprias barreiras, além das quais só pode contrair-se.
A prolongada crise atual, conjugada com o acirramento das contradições e da rapina postas em ação pelos principais países e grupos de capitais imperialistas, agravada pela destacada arrogância dos capitais e do Estado dos EUA em manter-se à testa de todo o sistema capitalista mundial, tem arrastado o globo terrestre para sombrias perspectivas. O que aconteceu a 11 de setembro em New York também é resultado — e não causa — de tudo isso. Por outro lado, a devastação, por um bombardeio sistemático, que os EUA e nações aliadas praticaram no Afeganistão, sob a farsa de que se trata de uma cruzada das forças “do bem” contra as do “mal” (Bin Laden e Cia.), não passa de uma farsa a esconder toda uma estratégia de ocupação e dominação cabal do imperialismo sobre todas as regiões do globo como o próprio Afeganistão, país que se situa no centro das maiores reservas de petróleo do mundo.


Conclusões
A crise política ameaça jogar por terra a hegemonia mundial dos EUA e seu sistema imperial. Ninguém se iluda quanto ao caráter desta crise, ela é uma crise geral do modo de produção capitalista, que retoma o processo de transição histórico da sociedade para um novo modo de produção, ainda não delineado em todos seus contornos, exigindo a intervenção dos sujeitos históricos, como classes sociais cônscias, para além da tragédia humana – guerras, caos econômico e social, catástrofes geológicas e climáticas que acompanham o processo. Faz-se necessário o trabalho e o esforço incansável na edificação de um modo de produção e vida mais elevado, justo e solidário para todos.
Os papéis nos Estados Unidos e na Europa caíram em média mais de 25%. A desvalorização mensal acumulada em outubro na maioria dos principais mercados do mundo será uma das maiores já testemunhadas por qualquer pessoa ainda viva. Até agora a crise fez a bolsa de valores de São Paulo cair em cerca de 54%, várias empresas perderam em torno de US$40 bilhões aplicados em títulos de hipotecas nos EUA e tantas empresas e bancos afundaram. A moeda brasileira se desvalorizou cerca de 40% frente ao dólar, elevando a dívida indexada na moeda americana e comprometendo a capacidade de pagamento do país, aumentando o índice do risco-país que acarretará na queda dos investimentos externos, afetando a agricultura, a construção civil e a indústria automotiva, elevando o desemprego, a inflação e a carestia.
O Brasil necessita urgentemente de um caminho alternativo, uma integração que tenha como objetivo trocas iguais de mercadorias. Para tudo isto é necessário pensar geopoliticamente o país em termos da articulação de um sistema de defesa continental contra o imperialismo.
A crise é mundial, estrutural e não é um parênteses que será fechado em breve. Não podemos, após esta crise, continuar a governar o mundo com os mesmos instrumentos, instituições e idéias do passado.



Referências Bibliográficas
ABREU, H.B. As novas configurações do Estado e da Sociedade Civil. Capacitação em Serviço Social e Política Social. Brasília: CFESS/ABEPSS/CEAD/UNB, 2000.

BEINSTEIN, J. - Capitalismo Senil - A Crise da Economia Global. São Paulo: Editora Record, 2001.

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. São Paulo: Nova Cultural, 1988.

LÊNIN, V.I. Imperialismo fase superior do capitalismo. São Paulo: Global Editora, sexta edição, 1991.

LUXEMBURGO, Rosa. A Acumulação do Capital: contribuição ao estudo econômico do
Imperialismo. São Paulo: Nova Cultural, 1985.

SCHINCARIOL, Vitor Eduardo. Endividamento externo da economia dos Estados Unidos (1980-2004): uma interpretação kaleckiana. São Paulo: Simpósio de Pós-Graduação em História Econômica na USP, 2008.

[1] http://drauziomilagres.blogspot.com/2008/02/custo-da-guerra-de-bush-us-3-trilhes.html


*Tema Final proposto para a disciplina de “Economia e Política Internacional” do curso de RI.
**Aluno do Curso de RI do PT. Gestor de TI. Membro da Executiva Municipal do PT de Simão Dias/Sergipe

Política Externa Brasileira e a Integração Regional na Era Lula: Análise Paradigmática

Política Externa Brasileira e a Integração Regional na Era Lula: Análise Paradigmática*
Paulo Roberto Daltro de Carvalho**
Resumo
A política externa representada pelo governo Luís Inácio Lula da Silva tem chamado a atenção de observadores e estudiosos do mundo inteiro, em vista de vários aspectos inovadores em sua formulação e execução. Através deste trabalho buscamos identificar quais as continuidades e transformações da política externa brasileira dos governos mais recentes. Utilizaremos alguns conceitos para compreender melhor o paradigma realista das relações internacionais.


Palavras-chave: Relações Internacionais; Política Externa; Lula.


Introdução
Tanto o estudo das relações internacionais quanto da política externa brasileira passa necessariamente por construções teóricas feitas a partir da noção de paradigma. No plano mais geral foram elaborados paradigmas de análise teórica das relações entre as nações buscando estabelecer elementos e características constantes a estas interações.
Em um breve histórico do balanço mundial de poder no século XX desde o mundo multipolar que caracterizou a primeira metade do século até o mundo unipolar, sob hegemonia dos Estados Unidos, que marcou a sua última década, passando pelo mundo bipolar o cenário externo foi modificado com o fim da Guerra Fria entre americanos e soviéticos que deu o tom das relações internacionais e tendo por conseqüência o término do sistema de poder baseado na bipolaridade. Estes acontecimentos são também considerados por estudiosos como elementos referenciais de política internacional. A disputa ideológica entre comunismo e capitalismo agora abre suas portas para as discussões e entraves econômicos, sem falar de temas como direitos humanos, meio ambiente, narcotráfico e competitividade internacional que passam a ocupar lugar de destaque no cenário internacional. Apesar de representarem uma importante mudança no eixo de discussão das questões internacionais, o caráter anárquico, oligárquico, hierárquico e seus conflitos de interesses nacional são mantidos como características estruturais do sistema internacional. Estaríamos testemunhando o início do fim da hegemonia americana e a formação de um mundo multipolar embora a hegemonia militar americana continue firme.
O Brasil do governo Lula, se inclui neste contexto de mudanças e continuidades. Há uma grande concepção da internacionalização da economia brasileira e adesão às regras e normas internacionais. Estes – praticamente - seis anos do governo Lula marca a política externa brasileira na economia global.


O realismo político e a análise das relações internacionais
Estudos mostram que o realismo político é o paradigma que mais se desenvolveu nos últimos cinqüenta anos, aproximadamente depois do final da Segunda Guerra Mundial. No entanto, autor clássico como Nicolau Maquiavel deu as primeiras bases do que foi e tem sido a perspectiva que predomina as explicações da teoria das relações internacionais.
Um dos elementos identificador e fundamental do realismo é que seus executores consideraram os homens, as relações sociais e os países com eles são e não como gostariam que fossem. O Estado-Nação é colocado como centro da reflexão, agindo racionalmente e tem suas ações guiadas pela busca do poder e pelo uso de forças bélicas.
O realismo político é conceituado através de alguns princípios básicos. Primeiro, a política é governada por leis objetivas e a possibilidade de desenvolver uma teoria racional reflete de maneira imperfeita estas leis. O segundo princípio é o conceito de interesse entendido como poder. Este conceito faz a ligação entre a razão que tenta entender a política internacional e os fatos, coloca uma ordem racional no problema da política. Desta forma, o terceiro princípio propõe que o conceito de interesse seja analisado como categoria objetiva válida universalmente. Mas, o tipo de interesse depende do contexto político e cultural de cada nação que compõe o sistema internacional. O quarto princípio trata do significado moral da ação política. Valores morais universais não podem ser aplicados aos atos dos Estados. É importante lembrar também que nações são entidades políticas defendendo seus interesses. Desta forma, o quinto princípio considera que as aspirações morais de uma nação não podem ser consideradas como preceitos que governam o universo. Já o sexto princípio coloca a existência de uma autonomia da esfera política. As relações internacionais se definem por uma busca constante do poder, essa busca pode ser para mantê-lo, aumentá-lo ou demonstrá-lo.


Política Externa de Lula: mudança ou continuidade?
A política exterior representa para o governo Lula, assim como para governos anteriores, papel de destaque dentre as formulações das políticas governamentais. Um dos fatores que definiram o rumo da política externa brasileira foi à escolha de Celso Amorim para desempenhar a função de ministro das relações exteriores. Diplomata de carreira, Amorim sempre defendeu uma postura autônoma do Brasil nos foros multilaterais. Tanto o Ministro Celso Amorim, como seu principal auxiliar, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, onde juntos têm conduzido uma das fases mais dinâmicas da diplomacia brasileira em qualquer época histórica.
O Ministro Celso Amorim define a política externa do governo Lula como “ativa e altiva". Tem uma postura mais assertiva, defesa da soberania nacional e da igualdade com maior ênfase retórica. Celso Amorim acredita que a ação diplomática do governo Lula é concebida como instrumento de apoio ao projeto de desenvolvimento social e econômico do país. "É nacional sem deixar de ser internacionalista" (Amorim, 2005).
Sendo assim, o governo Lula representa uma combinação de continuidade e mudança. Muitas das políticas de integração regional e aos mercados internacionais iniciadas no governo anterior estão tendo continuidade no governo Lula, em termos de ação junto à esfera econômica não há mudança substancial. A maior ruptura é, talvez, representada pelo estilo de ação política do governo Lula, mais enfático e atuante no cenário internacional.
Para o diplomata de carreira, Paulo Roberto de Almeida as mudanças mais significativas na postura externa do Brasil e em algumas linhas de sua política externa ocorreram, obviamente, ao longo do primeiro mandato do governo Lula (2003-2006), com novas ênfases e alianças preferenciais, uma nítida mudança no discurso e na forma de se fazer diplomacia, talvez mais do que em sua substância, com algumas correções de estilo e também de prioridades ao início do seu segundo mandato e conclui: “Mesmo que a maior parte da sua agenda diplomática tenha apresentado mais elementos de continuidade do que de ruptura com a política anterior, alguns elementos inovadores devem ser destacados como identificadores das novas ênfases e prioridades” (Almeida, 2004).
A política externa do governo Lula é definida por José Flávio Sombra Saraiva como realista, universalista e pragmática. "Lula fez, assim, uma correção de rumos que foi solicitada por aqueles que ao o elegerem, também reivindicavam um modelo de inserção que fosse menos vulnerável para o Brasil e mais autônomo e desenvolvimentista" (Saraiva, 2005). Além disso, um dos pontos positivos da diplomacia do governo Lula é que não está mais tão centralizado na figura do presidente da república como era durante os mandatos anteriores. A diplomacia presidencial foi substituída por uma diplomacia de interesses a serem defendidos com uma busca ativa de coordenação política.
A construção de um mundo multipolar parece ser de grande importância para a política externa do governo Lula. Visto o esforço de aproximação dos países da África, da Índia e China. As relações com os países do Mercosul e outros da América Latina também tem merecido atenção especial. Esta busca de parceiros independentes do mundo desenvolvido é, na maioria das vezes, uma continuidade de ações governo anterior, mas são impostas inovações conceituais e diferenças práticas. A maioria das ações do governo Lula, a exemplo de governos anteriores, situa-se na vertente das negociações comerciais internacionais e na busca de coordenação política com parceiros independentes do mundo desenvolvido.

Segundo o diplomata Paulo Roberto de Almeida acredita que o discurso político-partidário em temas de política internacional comanda a ação governamental, para ele, este é o eixo da política do governo Lula que mais se aproxima das formulações originais do seu partido o PT: “Em outros termos, é nas relações exteriores e na sua política internacional que o governo do presidente Lula mais se parece com o discurso do PT” (Almeida, 2004). O diplomata também acredita que no plano diplomático e econômico pode ser ressaltada uma postura essencialmente crítica quanto à globalização e à abertura comercial. Para o governo Lula, as relações com o FMI e o Banco Mundial serão mantidas apenas enquanto forem estritamente necessárias.
Almeida resume a atuação política da chancelaria de Lula da seguinte maneira: "No plano político, é evidente o projeto de reforçar a capacidade de ‘intervenção’ do Brasil no mundo, a assunção declarada do desejo de ocupar uma cadeira permanente num Conselho de Segurança reformado e a oposição ao unilateralismo ou unipolaridade, com a defesa ativa do multilateralismo e de um maior equilíbrio nas relações internacionais. No plano econômico, trata-se de buscar maior cooperação e integração com países similares (outras potência médias) e vizinhos regionais" (Almeida, 2004).
O Governo Lula foi uma importante etapa para a experiência democrática no país. De certa forma, o fato de um partido como o PT formalmente considerado de esquerda ascender ao poder nos insere em uma nova etapa do jogo democrático nacional. A chegada de Lula, ‘socialista’ de fato, pode dar fim a um pensamento político que excluía a chegada de novos grupos ao poder.


Revendo a Política Comercial do Governo Lula
Para Kjeld Jakobsen, ex-secretrário de Relações Internacionais do município de São Paulo, autor do livro: Comércio Internacional e Desenvolvimento: Do GATT a OMC – Discurso e Prática, diz que: “As idéias de abertura econômica e livre-comércio foram bem aceitas pelos países que desenvolveram seu parque industrial e buscavam novos mercados a partir do século XIX. No entanto, em relação a estes mercados, os países exportadores aplicavam um liberalismo de via única. As colônias e os países asiáticos e latino-americanos participavam da divisão internacional do trabalho apenas como exportadores de produtos primários – minérios e produtos agrícolas – e como importadores de manufaturados. (...) Um dos principais motivos que fomentou o crescimento do ideal da independência no continente americano foi à busca da liberdade econômica, possível apenas com liberdade política. Os Estados Unidos foi a primeira colônia do mundo a alcançá-la e passaram por um desenvolvimento todo particular, até se tornarem a potência econômica e militar que é hoje. (...) Os acordos bilaterais assinados, quase sempre com a Inglaterra, geralmente incluíam cláusulas de redução de tarifas externas para as manufaturas inglesas como condição para a concessão de empréstimos. Com isso, o país credor ganhava um mercado cativo e a produção local de manufaturas não era estimulada. Assim, os recursos para pagar a dívida dos países latino-americanos ficavam dependentes de suas exportações de commodities, extremamente vulneráveis à quantidade que os países centrais compravam e aos valores que estavam dispostos a pagar. Quando havia retrações econômicas na Europa nessa época, o que levava seus países a diminuírem as importações, o efeito negativo era imediato na América Latina e nas colônias” ( JAKOBSEN, 2005).
Cabe ressaltar, em qualquer hipótese, que a diplomacia regional do segundo mandato do presidente Lula vem sendo conduzida por meio de procedimentos mais cautelosos, e bem mais realistas, do que tinha sido o caso no primeiro período. Com efeito, o entusiasmo com a causa da integração e as iniciativas políticas adotadas de maneira relativamente impetuosa na fase inicial logo se chocaram com realidades políticas distintas, em cada cenário sub-regional, e com fatores internos e externos de instabilidade política ou de “desalinhamento” em relação ao Brasil. O projeto mais ambicioso do Brasil, que era lograr a ampliação do Mercosul, como base tanto do exercício da liderança regional como da “resistência continental” à Alca, não conseguiu superar as mesmas dificuldades que já tinham paralisado o bloco desde a crise de 1999: diferenças de competitividade entre os membros e estruturas industriais não integradas e pouco complementares continuam a impedir o pleno funcionamento da união aduaneira a partir de uma tarifa externa comum uniformemente aplicada por todos. O Mercosul foi ampliado à Venezuela, mas sua adesão foi uma decisão de ordem essencialmente política, cabendo ainda serem de fato observados os prazos previstos no protocolo de convergência para sua plena incorporação ao regime aduaneiro comum e a todo o acervo de normas internas. Na verdade, o Mercosul não possui, a exemplo da antiga Comunidade Econômica Européia, um acquis communautaire que sirva de base à construção progressiva de um mercado comum: as diferenças não são apenas institucionais, mas também de ordem política.
De fato, o governo brasileiro entende que a defesa da liberalização constitui o principal denominador comum dos interesses dos países em desenvolvimento nas negociações de serviços e que é, a partir desse tema, que se pode criar uma “plataforma ofensiva” de negociação para esses países, que certamente será objeto de muitas demandas dos países desenvolvidos em outros modos de prestação de serviços. Deve ser lembrado, a propósito, que alguns países em desenvolvimento, como a Índia – parceiro essencial do Brasil no G-20 – estão entre os principais demandantes de liberalização na OMC.
A importância, na estratégia de negociações do Governo Lula, de considerações de política externa típicas do paradigma “globalista” não se evidencia apenas na revisão do modelo de negociações com os países do Norte, adotado nos anos 90, em que as negociações preferenciais desempenhavam papel relevante, senão central. Ela também se manifesta na “volta” à estratégia brasileira do componente de cooperação Sul-Sul.
De maneira geral, o Governo Lula tem sinalizado, nas negociações comerciais, uma continuidade com os eixos centrais da política econômica externa do Brasil herdada dos governos pós-abertura comercial no início dos anos 90. Nesse aspecto, destaca-se a tradicional prioridade conferida às negociações multilaterais, e uma aposta inequívoca no sentido estratégico do Mercosul e da integração regional na América do Sul, a despeito do aumento da fragilidade do bloco. Ao mesmo tempo, percebe-se uma sensível mudança na hierarquia das agendas de negociação hemisférica e inter-blocos. Ao contrário do Governo FHC, há uma manifestação de preferência explícita pela integração Mercosul-UE. É preciso impulsionar politicamente o acordo Mercosul-UE e que as dificuldades já são conhecidas de todos: as áreas de agricultura, serviços e serviços financeiros. Estas dificuldades de caráter técnico e econômico podem ser superadas com vontade política. Seu objetivo econômico nas negociações com a EU, reside, sobretudo, no acesso ao mercado europeu, em especial ao setor agrícola. As várias estimativas explicitam a possibilidade de ganhos derivados do acesso ao mercado agrícola europeu.

Conclusões
A política de concertação diplomática, realista, é hoje um campo possível, graças ao alargamento diplomático para com todos os países africanos, uma política posta em prática nos últimos quatro anos, que veio a substituir a chamada política seletiva: as mudanças de rumo lavadas a efeito pelo Itamaraty são positivas, mas ainda dependem do reforço da presença, diplomática brasileira, o que leva à necessidade de quadros.
O diplomata Paulo Roberto de Almeida do seu ponto de vista do conteúdo, a diplomacia do governo Lula apresenta uma postura mais assertiva, mais enfática em torno da chamada defesa da soberania nacional e dos interesses nacionais, assim como de busca de alianças privilegiadas no Sul, com ênfase especial nos processos de integração da América do Sul e do Mercosul, com reforço conseqüente deste último no plano político. Tudo isso não deve surpreender os observadores mais argutos, pois que essas propostas figuram nos documentos do PT há praticamente vinte anos, por vezes nos mesmos termos e estilo (até na terminologia) que os atualmente proclamados, coincidindo, portanto, com a política externa praticada pelo governo Lula.
Desta forma, acredita-se que o Brasil atua hoje, muito mais próximo do paradigma do Estado logístico do que os mandatos que precederam. É evidente que nem todas as características do Estado logístico estão plenamente implementadas, há ainda resquícios do Estado normal, levado a cabo no governo FHC. Por isso, entende-se que a política exterior do governo Lula, até agora, pode ser definida como um misto de continuidade e mudança da era FHC.


Referências Bibliográficas
ALMEIDA, P. R. Uma política externa engajada: a diplomacia do governo Lula. Revista Brasileira de Política Internacional. Brasília, ano 47, no. 1, 2004.

AMORIM, C. L. N. Pelos Resultados. Entrevista concedida à Revista Carta Capital. 21 de fevereiro de 2005.

JAKOBSEN, KJELD. Comércio Internacional e Desenvolvimento: Do GATT a OMC – Discurso e Prática. São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo. 2005.

SARAIVA, J. F. S. Dois anos da política externa de Lula. Artigo publicado no site: www.relnet.com.br.



*Tema Final proposto para a disciplina de “Teoria das Relações Internacionais” do curso de RI.
**Aluno do Curso de RI do PT. Gestor de TI. Membro da Executiva Municipal do PT de Simão Dias/Sergipe.